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29.4.16

não queria ser hannah horvath

se bem sei de mim, contei essa mesma história há alguns textos atrás, há mais de um ano, porque sou assim: me repito. contei que estive em um relacionamento que não vingou e que acabou depois de uma briga ruim, porque eu fui ruim e ele também e porque não podíamos ser juntos. contei que ele me mandou um e-mail, um dia, enquanto eu terminava um trabalho importante e me disse que havia assistido a última temporada de girls e descoberto porque eu tinha gostado tanto: eu era a hannah,

fechei o e-mail, rápido, meio preocupada com tudo aquilo que tinha lido e outro tanto preocupada em terminar o trabalho importante. mas sou obsessiva, sei de mim assim, desde sempre e não sei despensar algo que fica ali, martelando na mente, "você é a hannah, você até fala como ela"; e me pus a assistir todas as temporadas de girls como a obsessiva compulsiva que sei ser. terminei em um fim de semana. eu era a hannah. e ele era o adam. e não podíamos ser. e ele ia um dia encontrar uma garota chamada mimi rose e ser feliz. e eu também ia ser feliz, do jeito que sabia ser.

eu não queria, e nunca quis ser hannah horvath. não só pelo ridículo que é "ser" um personagem de seriado, e nem só porque às vezes acho ela uma egocêntrica detestável. eu não queria ser hannah horvath porque sei de mim também como essa egocêntrica detestável, como essa pessoa que não sabe bem de si, que deixa cursos de escrita criativa, que sofre de toc, que troca de psicólogos, que pede ajuda chorosa, que corta o cabelo sozinha e que tenta superar uma decepção começando a correr, mas não muito e nem com tanto afinco como uma outra pessoa qualquer. eu não queria ser essa pessoa que escreve, mas não muito. que fala de si, o tempo todo, porque não sabe bem dominar outro assunto; mas que, ao mesmo tempo, nunca se sentiria segura o suficiente pra ser lena dunhan e criar toda uma obra baseada em si mesma. eu sou uma lena que ainda não é. e que nunca deve ser.

na minha breve vida, destruí relacionamentos por pura displicência e larguei empregos porque queria estar aberta para um mundo melhor. sigo com ela, a palavra, e choro no fim da temporada desse, que é meu único seriado preferido, que é a única coisa (além do meu atual namorado) que ainda não deixei de amar. porque eu deixei de amar amores, profissões, lugares, hobbies, exercícios funcionais e todo o resto. porque eu já sofri tendo certeza que, em algum apartamento, meu ex-amor comentava com a atual namorada que eu podia aparecer pregando um gato na porta deles ou jogando uma bicicleta pela janela.

porque eu já pensei em jogar uma bicicleta pela janela, mas assim como hannah, tenho braços fracos demais e sei que seria uma ideia estúpida. assim como a hannah eu sei, que vou sempre ser isso mesmo que eu sou. essa pessoa que, já saiu chorando na rua e já jurou que ia conseguir correr mais de cinco quilômetros logo depois de uma grande decepção amorosa.

eu já quis muito ser outra pessoa. uma pessoa melhor. uma pessoa dessas fácil de entender. uma pessoa menos obsessiva, que não larga empregos e hobbies pela metade e que nem pensa em aparecer chorando na porta de um ex-amor, ou em ligar de madrugada, dois meses depois do término, perguntando se a culpa tinha sido mesmo minha. eu queria não ser a louca que pode - e vai - escrever um texto sobre tudo que aconteceu e transformar histórias pessoais em livro. eu queria não ser essa que some, que corre, que fala, que bota os pés pelas mãos.

queria não ser, mas sou.
sou eu, e pareço muito com a hannah. e jogando ou não uma bicicleta pela janela, seguirei sendo eu. no fim de tudo, fica a conclusão: é tudo que posso, e não é - nem de longe - tão ruim quanto parece.

Um comentário:

William LS disse...
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