Páginas

27.10.10

Foi em 29/04/2007

. Atualmente eu não sou amada por ninguém do sexo oposto, que eu saiba. Vivo sozinha. Sou pouco independente. Fui trocada por chocolate hidrogenado mais uma vez. Sobrevivi. Sou ao mesmo tempo mais forte e mais frágil do que eu imaginava. Não tenho namorado, nem rolo, nem droga alguma. Sou mais macho que muito homem. Preciso estar sozinha as 7 a manhã. Não cumprimento ninguém quando quero estar comigo mesma. Tenho botado as idéias no lugar. Tenho sido ao mesmo tempo minha melhor e pior companhia. Tenho tristezas repentinas e temores. Mal estares. Medos a flor da pele. Espero anciosamente por alguém que me mereça. Idealizo amores perfeitos em que não acredito nem um pouco. Escrevo a vida que queria ter. Meu coração doeu numa sexta feira. Doenças piscicossomáticas. Na outra sexta feira, a decisão mais dificil. Me sobra a dignidade. mais doenças. estou sobrevivendo. Me assusto com essa força estranha. Me assusto com a fragilidade física frente a tudo. Detesto e amo ser eu mesma, ao mesmo tempo. As coisas não deveriam ser mais facéis.

Não acredito nos homens.

Tenho pavor de juntar escovas de dente. Sou ao mesmo tempo minha melhor amiga e pior inimiga. Acredito num propósito maior. Espero não ter que adotar Luísa. Não sei pra onde a vida vai me levar. Vivo de pequenas poções de ilusão e mentiras sinceras, quando tenho plena consciencia de que são isso que elas são. Não tolero traição. Estou carente. Preciso de demonstrações públicas de afeto e alguém que responda meus e-mails. Preciso de amores que pareçam sobressair ao tempo, ao espaço e as dificuldades. Não estou triste, nem absolutamente feliz. Luto contra dores de cabeças horríveis e stress. Não choro. Não como direito a uma semana. Chico é o único homem da minha vida. E felizmente eu tenho meus amigos.

Acredito num propósito maior pra essa vida. Ainda tenho esperanças.
Estou me descobrindo a cada dia e muitissimo satisfeita com isso. Me sinto bem na própria pele. E de cabelos negros.

Café forte. Sem açúcar. ùnica e exclusivamente pra quem gosta.
Eu, Prazer.

(faz quase-quatro anos e eu me sinto mais ou menos da mesma maneira. Pode?)

14.10.10

De guarda-chuva vermelho.

- é que tem tanta gente-escritora nesse mundo que nem sei.

- você é diferente do resto da gente-escritora.

- não sou não, porque no fundo, todo mundo sente a mesma merda, o mesmo vazio. Veio do nada, sabe. Vai pro nada também. típico. Todo mundo escreve sobre os entremeios.

- os seus entremeios são diferentes.

- não são, são a mesma merda. Meia duzia de escolhas erradas, solidão, eu-não-pertenço-à-esse-lugar que depois evolui pra um eu-não-pertenço-à-esse-mundo e aí tem aquele vazio enorme de existir e no meio disso tudo uns amores frustrados.

- você poetisa seus entremeios de um jeito diferente.

- me acho tão igual o resto-todo. e não só a gente-escritora não. to falando. me acho igual à gente-toda.

- se tu fosse igual à gente-toda, eu não tinha te escolhido.

- e tu parece que não sabe, que quando as pessoas se apaixonam pelas outras elas vêem tudo diferente nessa pessoa, por mais que ela seja igualzinha à gente-toda.

- e eu te notei como?

- sorte, destino, grande junção dos polos, o encontro de saturno. Vai saber que merda, mas a grande verdade é que a gente tava andando na rua, sentou no mesmo café, você achou aquilo um grande-encontro-cósmico e veio comentar sobre o grande-encontro-cósmico comigo, e disse bem assim: "qual é a chance, no meio desse universo de bilhões de pessoas, nós dois, estivéssemos desde o meio do caminho nos dirigindo ao mesmo lugar, e usando guarda-chuvas vermelhos?" eu nem ia te dar confiança, mas você usava guarda-chuva vermelho e isso denotava qualquer uma das quatro qualidades que eu ressalto em um ser humano: ou tu era engraçadinho, ou excêntrico, ou tava usando o guarda chuva da tua mãe, ou era pão duro mesmo. Porque ninguém, além de mim, sairia de casa com um guarda-chuva vermelho. E homem ainda.

- tu nunca me contou isso.

- tu nunca me disse porque tinha o guarda chuva.

- comprei numa promoção, achei bonito, dei pra minha mãe e continuei usando.

- todas as alternativas anteriores. Eu tava é bem certa quando te dei confiança.

- eu só fui conversar com você porque você rabiscava loucamente um pedacinho de papel, depois de procurar incessantemente uma caneta como quem procurava a saída de um túnel pra escapar da morte. O lance do encontro-cósmico era pra puxar assunto.

- e o que é escrever senão tentar achar incessantemente a saída de um túnel pra escapar da morte? E você nunca soube o que eu escrevi ali.

- soube sim.

- soube nada!

- você foi no banheiro, eu li. dizia "chove mil e novecentos litros e eu ainda não aprendi a sair de bota, esses all-star molhando meu pé todo. No caminho, enquanto tocava yellow do chris martin

- totalmente típico - e eu me molhava de capuz pensando estar na praia, mas não era praia nenhuma, era concreto-e-asfalto. Na minha frente vinha um guri, ele tava todo vestido de preto, tinha uns cabelos ondulados bonitos (acho que eram ondulados, ele tava de capuz também ) de all star (deve estar molhadíssimo) e guarda-chuva vermelho, igualzinho ao meu. Eu fico pensando que um homem que tem um guarda chuva vermelho só pode ter uma das quatro caracteristicas que eu prezo num ser humano: ou é engraçadinho, ou é excentrico, ou pegou da mãe ou é pão duro mesmo. Ele sentou do meu lado. Se fosse um filme a gente ia se falar, derrubar café um-no-outro e comentar dos guarda-chuvas vermelhos. Ele ia ser o grande-amor-da-minha-vida. Mas só vou voltar pra casa e comentar com alguém que era bem bonitinho aquele menino do guarda chuva vermelho. Daí nunca mais vou ver na vida. Já perdi assim setenta e sete grandes amores da minha vida. Não vai ser por falta desse"

- você guardou o guardanapo, por isso que eu nunca-mais achei! também esqueci dele, tava meio encantada com você, seu guarda chuva e seu papo que tropeçava toda vez no final da frase, vinha uma gaguejada. Eu fingia que não tava percebendo e tomava café.

- Agora tu vai e diz que um amor que começou com esse trecho-escrito é de gente-toda. É de gente-escritora, do tipo que encara cada palavra como uma saída de um túnel que te salva da morte.

- Digo sim, sou gente. gente-toda. igualzinha essa gente aí.

- Tu usa um guarda-chuva vermelho. quem no mundo usa um guarda-chuva vermelho?

- Tu.

- É por isso que eu quis te encontrar. É que eu queria que todos os nossos dias fossem um pedaço de guardanapo narrados por você.

- Tu gosta-tanto das coisas que eu escrevo assim?

- Gosto de você e com você vem esse teu jeito de escrever, de amarrar as palavras como se tu soubesse exatamente que verbo e preposição usar depois de cada uma delas e parece que você escolhe cada uma delas como um balé, depois tira pra dançar. E você fala assim, e dedica as coisas assim, desse seu jeito de ficar parada e depois soltar uma frase-perfeita e eu te digo que desde o dia que eu li aquele guardanapo e guardei que eu viveria o resto da vida pra ouvir você contar essas suas palavras, palavra por palavra, como se cada uma delas fosse um passo pra me salvar de um túnel que leva a morte.

- Tais errado.

- Por que?

- Tu que não é igual a gente-toda. E eu soube que tu era diferente desde o dia que eu te vi ali de capuz e guarda chuva vermelho, você tem um jeito tão esquisito de se comportar, você anda como se você tivesse medo de tudo, do mundo. Tava encolhidinho debaixo da roupa preta, todo curvado, de all-star encharcado e nem olhava pros lados. Aí toda vez que me via dava de abaixar a cabeça como se eu fosse te roubar, ou qualquer coisa que fosse. E você ali, todo escondido, nem dava pra te ver. Só pelo guarda chuva, o guarda chuva te mostrava pro mundo e tu não queria. Mas eu te vi. E soube, tu é diferente da gente-toda.

- Mas eu não tenho nenhum talento especial, só essas coisas que eu faço e nunca dão certo, e esse meu jeito esquisito de querer te levar pra conhecer todas as coisas do mundo, como se o mundo fosse acabar daqui três minutos, é que às vezes eu esqueço que eu tenho o resto da vida pra compartilhar com você e às vezes também acho o resto da vida tão pouco, e eu te acho tão interessante que parece que eu tenho que retribuir isso com essas coisas que eu conheço, esses filmes, esses livros, durante esse tempo que você tá atarantada com as suas coisas que não são exatamente a literatura,mas são outras, que você gosta tanto-quanto. E eu sou só um cara normal, eu trabalho numa agência e tudo e dou aula no resto do tempo e você tem as suas roupas e os seus filmes, seus livros, seus roteiros. Eu preciso te dar o mundo em troca.

- E você me dá;

- Dou?

- Tu não percebeu ainda não? Aquele guardanapo, eu só escrevi porque você tava lá. O resto também, o resto eu só escrevo porque você existe. E as outras coisas, elas também só me deixam feliz porque você me dá forças, é que você tem que entender é que você faz a minha história. Eu só escrevo ela. Enfeitadinha.

- É que eu te amo.

- É que eu te amo de volta.

- É que você é a minha pessoa. No meio da gente-toda.

- É que você é meu guarda-chuva vermelho. No meio da gente-toda.

13.10.10

trecho de qualquer coisa-que-seja

É que às vezes acontece, assim, no meio das improbabilidades do universo, e pode ser que seja assim, que você encontre no café, no bar, no cinema, ou que trombe na rua e chame aquilo de simples acidente, ou quem sabe, de encantamento-fantástico, ou quem sabe seria simplesmente o encontro-de-nossas-vidas. É assim que se referiria então ao dia que conheceu aquela garota até-então sem nome e que depois viria a chamar de amor. Contaria, depois de onze e anos e dez meses do ocorrido, para a uma outra garota (que hoje te encara como você-mesmo, mas tem o cabelo e o sorriso que te encantou há exatos onze anos e dez meses ), que, se hoje ela existe e pode chamar aquele ser encantadoramente lindo de "mãe", é porque depois de um simples acidente, aconteceu um encantamento fantástico, já que no encontro-de-nossas-vidas, cada palavra nova tinha gosto de sorriso.

(e assim elas permanecem)

old soldiers, just fade away.

Você sabe, a última coisa que eu escrevi foi que eu provavelmente ia ficar te esperando em uma cadeira em qualquer lugar que seja. Eu disse isso mesmo. E mais que isso, eu pensei e senti que iria ficar esperando por você o-tempo-que-fosse-preciso. Ia mesmo. Ia colocar uma almofada na cadeira, maquiar a minha tristeza e ficar lá, esperando até o dia que você resolvesse me pedir desculpas. Acontece que hoje, nesse dia sem música que eu tive, eu fiquei olhando pra minha vidinha (e digo mesmo, vidinha, no diminutivo, porque não é nada que eu realmente possa chamar assim de Vida, com letra maiúscula) e percebi que por mais que eu sinta sua falta, aqui e ali, nos cafés, nas caminhadas, nas letras de músicas, eu já não preciso de você. Nem assim, na literatura. É que eu pensei em uma história e pela primeira vez ela não incluia você. Nem assim, como personagem maquiado. Eu pensei nesses mil álter egos que eu faço pra você, te chamando de mil nomes diferentes, e pela primeira vez, achei desnecessário. É que eu andei pensando em mim, sorrindo com as besteiras das ruas, com as crianças, juntando dinheiro pro sorvete. É que eu andei sem músicas que me lembrassem você, nem os lugares. É que eu sonhei em comer cocada, pão de queijo, em fotografar. Olhei as vitrines, me descobri no meio da moda e não quis que você sentisse orgulho de mim. Eu já não espero mais que você esteja ali pra colorir minhas histórias, nem como parte-integrante nem como parte-de-dentro nem como personagem secundário e nem como aquilo-que-eu-queria-que-você-fosse. É que pela primeira vez eu olhei pra mim antes de olhar pra você, e eu-sem-você sou feliz. Do jeito que eu posso. Nessa melancolia de cafés de fim de tarde, livros não-lidos dentro da bolsa, no meio da minha mania de cada dia querer ser uma coisa diferente, de às vezes não beber nada e no outro dia querer tomar um porre. No meio da minha indecisão de vida de mil coisas e no meio dessa minha descoberta gigantesca e sem fim, pela primeira vez eu me descobri sem você. E não doeu, nem fez furo, nem fez dor, nem fez arrependimento. Só aconteceu.

5.10.10

Esse sim é pra você. - O último e o primeiro.

É que é bem assim, hoje eu decidi que eu ia dormir mais cedo, que eu ia fazer as coisas e aí tô protelando de novo. Eu tinha um arquivo de texto com cartas pra você, era até uma coisa bonita, mas hoje, antes de dormir tarde por - eu prometo - a última vez na minha semana eu preciso te dizer essas coisas. Essas coisas que você nunca vai ler. Ou vai, e vai ficar bravíssimo como se cada palavra que eu escrevesse nova fosse um tipo de alfinetada pra você. Eu não sei o que é, mas ultimamente todo mundo tem pensado que eu me preocupo muito com elas a ponto de escrever pra elas. E isso é uma bobagem porque eu sou muito egoísta. São poucas às vezes que eu não estou escrevendo para mim mesma e querendo irritar a mim mesma. Pouquíssimas. Mas aí as pessoas me olham, acham que eu sou algum tipo de filha da puta que fica aí enchendo o saco de todo mundo o tempo todo, e eu até sou. Mas não assim. Na verdade, eu me preocupo pouco demais com os outros pra que deseje machucá-los de alguma maneira. Você menos ainda. Eu não ia querer te machucar de qualquer maneira, até porque, eu gosto muito de você. Gosto muito. É isso, nada mais que isso. Você não vai ouvir mais da minha boca que eu te amo, que eu morreria por você. Isso tudo já me machucou demais, já fez calo demais em mim e em você. E eu sei lá se eu te amo, se é que eu amo alguém. E eu espero que você entenda. Espero que você entenda também que essa é a última coisa que eu te escrevo, diretamente ou indiretamente porque nem tem lugar mais na minha literatura pra ficar inventando histórias sobre você. As coisas foram se tornando repetitivas. Minha vida foi se tornando repetitiva, é um eterno acordar e pensar que eu estou infeliz, depois pegar um ônibus ouvindo no meu ouvido que eu já fui mais feliz e ficar me esquivando da realidade tomando aqueles cafés que ora são muito doces e ora muito amargos. Depois eu fico me inventando, me reinventando e procurando companhia aqui e ali, mas isso não surte o mínimo efeito. E eu nem consigo disfarçar na sua frente que eu é, não sou feliz. E você não pense que eu faço isso pra jogar na sua cara que eu acho que você está fazendo coisas erradas ou isso ou aquilo, é só que eu preciso dizer em algum lugar que a minha vida não tá assim tão legal. E eu não sou nem tão digna e nem tão adulta assim pra fingir que comigo nada aconteceu.


Minha vida anda vazia e ultimamente eu tenho feito um tremendo esforço pra reparar as besteiras que eu fiz no passado, até pensei, podia te chamar pra conversar, mas você ia confundir de novo as coisas. Você é mais covarde que eu, em todos os aspectos. E entenda que eu não estou te dizendo isso porque eu quero te atacar. Eu te acho suficientemente interessante e suficientemente legal, mas não dá mais. Pra mim. Eu tentei ser civilizada o tanto que pude, e tentei não invadir a sua vida e tentei até fingir que eu estava bem pra não te magoar. Mas até isso tem um limite, uma linha. E a linha era entre aquilo que era a minha vida e a sua vida. Eu nunca coloquei o dedo na sua cara e te apontei tudo que eu achava que você tinha feito de errado e nem tem lugar pra isso. E aliás, você nem está fazendo nada de errado. Você só está vivendo a sua vida do jeito que você acha que deve e por mais que eu te olhe e ache que isso depois de nove ou dez meses não vai dar em nada, não importa. O que importa é que você esteja feliz do jeito que lhe cabe, e eu feliz do jeito que eu ache que deva. O seu problema, e o problema de todo mundo é se achar o centro do universo. De que tudo aquilo que eu faço, ou falo e até as lágrimas que eu derramo são pra você. Às vezes até é, mas na maioria das vezes eu só estou preocupada com a minha dor. E além da minha dor, com a minha vida. Tem todo um universo aí que você deixou de conhecer há muito tempo dentro de mim e que só é um pouco de dor misturado com um pouco de literatura. Minha vida podia ser do jeito que eu escrevo, e às vezes até soa mais bonita, mas por mais que eu e você nos enxerguemos dentro da história, aquilo não existe. Nunca existiu. É como se eu tivesse escrevendo um livro. A nossa história é isso, um livro. Uma coisa que eu inventei com começo meio e fim pra poder suportar a falta de coerência dos personagens. Esse desencontro todo não é bonito, não soa bem. Em algum lugar a história tinha que existir de outra maneira. E existiu.


Na verdade eu não espero mais nada de você. Nada além do que você pode me dar, e tudo o que você pode me dar é muito pouco perto do que eu preciso. Às vezes é hora de reconhecer que meia dúzia de palavras jogadas e duas tardes de conversa não vão me fazer ter uma vida mais legal, por mais que eu sinta saudades suas, assim, como pessoa. E talvez seja a hora de você perceber isso também. Acabou, nós temos outra vida e por mais que a separação doa, foi você que escolheu assim. Um dia, literal ou não literalmente, eu fiquei sentada na cadeira te vendo ir embora e você foi. Sem mim. Eu ensaiei três sorrisos, ensaiei falar de outra coisa, mas no fim, no fim eu acabei chorando. Eu fiquei lá chorando enquanto você ia embora sem mim. E só isso já foi uma dor maior do que eu podia suportar. Depois eu tentei, eu esperei que você viesse me buscar em outro lugar, e me explicasse tudo o que tinha acontecido de verdade pra que eu pudesse levar minha vida de um jeito mais suave. "tudo bem não deu certo, mas a gente se vê por aí." "é, se vê por aí" "espero que você seja feliz" "eu também, eu espero que você seja muito feliz" "a gente se vê" "é, a gente se vê". E aí a gente ia se encontrar no ônibus, no mercado, na esquina, você ia me contar como está a sua vida me negando os detalhes que você não ia querer que eu soubesse e eu ia te contar da minha vida também te negando os detalhes que podiam te magoar e ia ser assim até que um dia a gente se encontrasse de novo, ou não, no meio de uma outra vida, de um outro universo. Mas não foi assim. Eu que fiquei chorando, eu que doí, eu que levantei da cadeira atrás de você, eu que corri atrás de uma explicação que não veio e então fui eu que dei o fim na história que eu conhecia, sem fim nenhum. E por mais que eu saiba que eu podia lidar com isso caso isso tivesse acontecido de um jeito menos dolorido, eu que resolvi ir embora de vez. É, assim, hoje. E decidi me doer sozinha, pegar dois ônibus, lidar com a minha infelicidade que tem gosto de café doce e continuar te deixando em paz. Hoje eu decidi que eu não durmo mais depois das duas da manhã, que eu vou fazer uma dieta, que eu vou correr cinco quilômetros três vezes por semana, cortar o cabelo, viajar, ler livros, escrever cartas, e principalmente, não dedicar mais nenhuma linha que seja a você. Não que eu tivesse feito isso antes. Essa é a primeira e a última coisa especialmente endereçada a você que eu deixo ao acaso pra que você leia. O resto eram histórias. O resto era a sua culpa te dizendo que eu queria te machucar. Eu nunca quis. Eu sei que você não queria também, mas machucou. E devido a minha falta de tato com tudo, eu resolvi te deixar pra lá. Por você, mas principalmente por mim. Eu realmente espero que você seja feliz. Realmente. Eu nunca julguei suas escolhas. Eu só tinha medo que você fosse infeliz. E ainda tenho. Mas se você for, não é problema meu. Você tem o direito. Se um dia você ainda quiser me ver, você sabe onde me encontrar. É capaz de eu continuar naquela mesma cadeira em que você me deixou chorando um dia. Porque tudo que se definiu daquele dia em diante, fui eu que inventei. No mundo real, nada aconteceu desde o dia em que eu fiquei sentada lá. Se um dia você quiser me tirar de lá, é só me procurar. Só que também pode ter acontecido de eu ter decidido ir embora sozinha.


Eu já dei o primeiro passo.