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26.12.10

vou tirar as passas do arroz, e venha o que vier.



Lembranças e saudades. É assim que eu categorizo o ano que ainda-não-se-foi. O ano do não-presente, da espera pro futuro e da saudade do passado. Não me lembro de ter tido anos piores. Meus vinteeum anos me pesam como dois grandes sacos de 10kg em cima das costas. Uma dor nos joelhos, um enjôo de existir e o tédio. As pessoas continuam vivendo a vida delas em seus círculos paralelos enquanto eu fiquei meio presa nesse ano que nem existiu de verdade. Um ano que passou com uma terrível vontade de que se acabasse e com uma eterna saudade daquilo que foi e que não é mais. Vejo na parede fotos de pessoas que já se foram, e que a gente sabe, não voltam. Guardo no meu computador retratos-e-canções de tudo aquilo que um dia prometeu ser. Estou cansada, e por vezes choro. Tem dias que eu enjôo da vida, tem dias que ai. Acabaram-se os ciclos, acabaram-se os ritos, acabaram-se as promessas. Acabaram-se os amores. Acabou-se.

O que recomeça então, a gente se pergunta, e eu não sei. Tenho na colher o gosto de um brigadeiro que já se foi, e tenho em mim o sabor das conquistas que podiam ter sido, mas não foram. O fracasso, o medo, a insegurança. O amor, ah, o amor. Um ano inteiro de tanto amor e pouco espaço, de pouco amor e muita confusão. Um ano inteiro de tanta fantasia, tanta saudade, tanto apego, tanto dispêndio de energia, pra no fim continuar trilhando estradas por si mesma. Eu sei, e todo mundo sabe. A gente nasceu sozinho e morre assim também, no fim. E têm mudado tanto as pessoas que resolvem que dividirão comigo então a tal trajetória na vida. O que se leva, afinal, o que é pra sempre, quem é insubstituível, o que vai doer, o que vai ficar, quem vai me fazer feliz até o dia da minha morte? Tantas perguntas, nenhuma resposta, e as terríveis reflexões de fim de ano. Depois de quantas cervejas é possível saber de verdade o que a gente quer da vida? Depois de quantos abraços, de quantos brindes, de quantos desejos de um ano novo lindo, sabor de doce é possível saber que a gente vai ser feliz de fato? E quanto tempo demora até se concretizar a felicidade? E felicidade plena, existe? Existe no fim de tudo, a certeza da dúvida. E uma angústia. Uma angústia eterna de 365 dias se tornarem tudo aquilo que a gente sempre quis.

Um ano inteiro de saudades, e esforços. Eu ri, sim. É porque também se ri no sofrimento, ali no meio. Quando o sofrimento dói na carne, ou a gente se entrega, ou sorri. Arrisco a dizer que dei meus sorrisos mais sinceros durante esse ano. Lindos, abertos, perfeitos. Saí de cabeça erguida de todas as dificuldades e sorri também porque se sorri na hora da morte. Antes de fechar os olhos. Conservo em mim um orgulho infantil, uma capacidade de superação e uma eterna preguiça de viver. Conservo em mim o enjôo de anos de fracasso sem glória nem sorriso. O enjôo das despedidas sem ritos. Do não poder chorar na cara, do não poder dizer "vai, mas não vai sem saber que um pedaço de mim vai junto". Só a separação. A separação das pessoas, dos amores, dos sentimentos. A separação daquilo que se era e que se sabe, nunca mais será o mesmo. Será que é o peso dos anos que faz com que tudo perca um pouco a música, que com isso se vá embora a poesia, que se coma brigadeiros com gosto de saudade? Será que a cada fim de ano se perde a esperança do "que seja o melhor ano da minha vida" e se troca para "que seja melhor que o próximo".

É que às vezes a gente promete pra gente mesmo um ano novo cor de esperança, de nova-vida, de felicidade. Diz que vai fazer o melhor ano novo do mundo, se veste de branco promete e pede a paz. Escreve uma lista e sonha. Renova, reescreve, reinventa, abraça meio-mundo pulando num pé só, pulando ondas, sendo aquilo que dá pra ser, esperando sonhar um sonho, dois sonhos, e querendo que todos os sonhos do mundo caibam num ano só. Só que vida pressupões frustração e sonho nem sempre se concretiza. É certo que hão de vir anos terríveis e anos melhores-um-pouco. É certo que um dia a gente acorda no dia 29 de setembro e de repente começa ali um ano novo cor de felicidade. É que a vida é feita de encontro-e-desencontro. De gente que vai pra sempre prometendo voltar amanhã e não volta nunca-mais e de gente que vai pra nunca-mais e a gente encontra numa esquina qualquer da vida. É que tem vez que é a gente que vai pra nunca-mais. Tem vez que é a gente que se despede sem rito, tem vez que a gente que é surpreendido, mas tem vez que é a gente que surpreende. É que às vezes acontece de você ter o ano novo mais iluminado do mundo, e os piores 365 dias da história da sua vida. Aconteceu comigo. Pode ser que seja do barco ir firme e sem tribulação, e pode ser do barco virar. Pode ser do amor vir, e pode ser do amor acabar. Pode ser de acabar o amor que era pra sempre, pode ser de ser pra sempre o amor que já tinha terminado. É que no meio desse turbilhão terrível de ano, ainda tem o pouco-que-sobrou. Ainda tem um sorrisinho de canto-de-boca pra distribuir. Ainda tem uma roupa guardada e uma taça querendo-brindar que oxalá, o próximo ano há de ser iluminado, há de ser de paz, de conquista de doçura e só. É que no fim das contas, o brigadeiro ainda é doce, se tem saudade valeu a pena e cai um pacotinho novo de esperança piegas a cada dia trinta e um que faz gritar: "vai embora, ano velho, e traz pra mim um ano lindo".

23.12.10

De dois-mil-e-dez pra deus-sabe-quando.

E me dei pensando se um dia você vai ler todas essas coisas que eu um dia te escrevi. Sabe, esse livro, esse universo todo. E tomada de loucura, da minha prepotência também verbalizei: "é impossível e injusto que não". Eu sei que esse livro de capa preta vai estar guardado na nossa estante um dia. É, nossa. Na gaveta em que você guarda as suas tralhas. Vai sim. Ou o universo se mostraria muito injusto. É claro que o universo é injusto. É injustíssimo. E é no meio dessa injustiça toda que existe a possibilidade de você nunca me ler. É também no meio das improbabilidades do universo que eu sei também que posso te achar um idiota daqui há menos de seis meses e encontrar então um cara incrível, o cara mais incrível do mundo, e casar e ter uma porção de filhos. Mas hoje não. Hoje esse mesmo universo injusto e improvável me dá a certeza de que essas bobagens um dia vão estar na sua estante. Na nossa. E você vai ler comigo e rir. Rir de hoje, rir de você e rir da injustiça do universo de ter nos mantido separados por tanto tempo. Essa é uma carta pro futuro. Eu te amo, você também vai me amar e quando ler isso não vai mais me achar louca, vai achar lindo. Hoje eu me dou ao luxo de ter certeza, e que se dane a confusão em que a vida está e quanto tempo faz que eu não vejo o seu rosto. Um, dois anos? Pouco importa se enquanto eu escrevo essa carta-texto ou o que seja você esteja do outro lado do mundo, ou da rua, trepando com outra menina e jurando a ela amor eterno. Hoje não é a hora, mas depois vai ser. Daqui há dois meses, três ou dez anos. Vai ser. Não importa quantos caras eu ame. Não importa com quantos caras eu trepe. Não importa pra quantas meninas você vai jurar amor eterno e dedicar livros. Não importa. Eu tenho uma certeza imensa - que não dói - que alguém nesse universo, seja lá quem cuide dele, me escolheu pra ser sua. E você pra ser meu. E que se foda. Eu enxergo meu livro na nossa estante, meu café na sua xícara e meu corpo no espaço que o seu deixa sobrar na cama. E enquanto você não aceita meu amor, eu te dou minhas palavras. Em todas as manhãs que eu chego em casa sozinha, e sei, você é meu. E de mais ninguém.

22.12.10

"E não pensa que eu fui por não te amar."

Afinal, pra que lado nasce o sol?

Eu fiquei pensando, depois de ouvir o barulho dos pássaros, que eu nunca vi o sol nascer. Ouvi, várias vezes. Vi também o dia clarear, mas o primeiro raio de sol eu não sei donde vem. E enquanto penso nisso, penso também em você, porque hoje o dia foi meio teu. Um dia todo cinza, chuvoso, com eminências de te encontrar, histórias tuas, arrependimentos. Eu fico pensando que devo ter perdido dias pensando em você com a mesma freqüência que perdi nasceres de sol por estar dormindo. Com você eu vi o dia amanhecer uma vez só. E teve poesia na estranheza, mas isso é só mais uma daquelas histórias que eu teimo em contar pra quem ainda não enjoou de nós-dois. Teve também a outra vez que eu acordei tendo certeza que queria ver todos os dias amanhecerem do teu lado, mas te deixei ir, desapegado como sempre.

Eu sei que eu tempo perdido muita vida. Tenho insistido em reviver histórias, em causar encontros casuais forçados, em tentar encontrar aquele amor que eu via refletir dos teus olhos nos meus em algum lugar. É difícil viver sem você. Mas é mais difícil ainda viver sem amor. Eu já não sei o que eu espero de você. Das poucas vezes que o dia amanheceu e eu vi, não teve nenhum olho pra refletir nada. Eu revejo nossa história, eu tento deixar isso vivo no papel, eu sou capaz de lembrar das cores das suas roupas em cada encontro. Eu não sei se eu sei mais. Faz tanto tempo que você se foi. Eu fico no esforço tão infantil para não deixar você morrer. É tudo uma grande desculpa. Ora eu digo que eu acho que você não está feliz, depois eu teimo em me convencer que lá no fundo alguma coisa coisa em você ainda me ama. É que eu acho injusto te deixar morrer, sabe? um-amor-tão-grande-assim. Mas por quanto tempo?

Por quanto tempo eu vou esperar que a sua vida mude de rumo e se encontre de vez com a minha. Eu sei, é muito bonito escrever um amor e, como uma flor no quintal, não deixar morrer, podar as pontas, os galhos mortos, colocar adubo pra crescer mais forte e bonita, mas de que adianta? Fica a flor num canto, enfeite-de-parede, linda-linda, mas sem ninguém pra ver, amar, pra presentear com a flor. É a flor e só. Sabe, eu não quero um amor pra alegrar o ambiente, eu nem nasci com vocação pra ficar encostadinha na estante esperando você vir me resgatar dos males do mundo.

Eu sei que eu construí um castelo e esperei que você morasse nele, mas não dá. Tem toda uma história que eu cansei de rescrever, reinventar, enfiar fins em que você voltava por aquela porta com um ramo de flores. Pode até ser que você seja mesmo o meu fim, o fim em si mesmo, o amor-maior. Eu não duvido de nada, eu até espero que seja assim. Mas eu estou perdendo os entremeios. Cansei de escrever você, rescrever você, reinventar você. Cansei de você ser meu verbo e a minha canção. Ainda acho o nosso amor lindo-lindo. Ainda lembro como era me ver refletida nos teus olhos, sorrindo. Mas e a vida, onde fica a vida, as histórias paralelas, as tramas secundárias, as flores que nasceram pra morrer, os castelos construídos pra ruir? Onde ficam meus encantamentos sem amor, histórias inventadas que não vão ser eternas, mas tentam.

Me diz onde fica a minha vida agora que você resolveu ir e nem sabe se volta. Eu te dei de presente a história de amor mais linda que duas pessoas não chegaram a viver. Um livro inteiro de memórias póstumas de um amor que nem nasceu pra que pudesse morrer. Cartas não enviadas, bilhetes no espelho, despedidas doloridas e músicas que você ainda não ouviu. Você foi o meu grande-amor, a minha literatura e o meu verbo enquanto deu-de-durar. Eu ainda te amo, eu não minto não, me doem as chuvas e as noites em que eu passo em você, me dói ter o sofá inteirinho pra mim, mas de repente me deu uma vontade louca de tentar outra coisa, outra história, outro momento, outra paixão. Inventar outra casa, outra vida e deixar crescer outra flor no jardim. Deixar a flor crescer, podar as arestas, aguar toda semana três vezes por dia, cuidar de outro amor, outro encantamento. Teu amor ainda tá aqui, tá guardado, tem livro, tem casa, tem castelo e tem sonho. Poxa vida, quanto sonho coube (e cabe) no nosso amor. Mas agora me deixa, eu quero soltar da tua mão, quero provar outras coisas. Eu sei o quanto é difícil essa redescoberta, mas da janela do meu quarto olhando o sol nascer eu de repente não vejo tanto-sentido-assim nesse amor que não é, que insiste em não ser e eu insisto em dar vida.

Eu dei de descobrir em outro lugar pra que lado nasce o sol - "para que minha vida siga adiante"

16.12.10

I want to live where soul meets body.

Tem tanta coisa que eu quero te dizer, e eu digo isso loucamente, minha cabeça quer te cuspir tudo isso que a gente devia-ter-sido-não-foi. Guardei todo o sentimento, teu, todo-teu num caderno preto na gaveta. Fiz um relicário da nossa história, uma via crucis de sentimento. Amor, você não tem o direito de me deixar assim, segurando no pé da mesa, roendo as unhas a te esperar entrar por aquela porta e dizer que ainda-me-ama que ainda-me-quer que nunca-deixou-de-me-amar. Eu lembro do dia que você me deixou, lama nos seus tênis sujos e foi. E eu fiquei. Fiquei no frio, na chuva, no desamparo, no desconsolo. Por que você não me contou que no meio disso tudo tinha outra mulher, outro problema, outro universo? Eu ia te entender, ia deixar você ir pra depois voltar. Mesmo que meu primeiro impulso fosse te agarrar pelos pêlos e pelos cabelos, e te dizer "fica comigo fica comigo por favor" que eu não sei viver sem você, e não sei mesmo, olha, meu deus, não sei mesmo. Não soube naquele dia, não soube nos entremeios, não sei até hoje viver sem você e você me culpe se quiser por ter construído tantos castelos assim, tantos lugares, ter deitado tantos dias debaixo das estrelas e sonhado tanta coisa que não-ia-ser com você.

Quanta locura cabe aquí dentro, amor, quanto desespero. E pensar que era eu quem tratava amor como fórmula matemática. Te olhei da primeira vez, fiz um cálculo-base que resultou em dizer pra você que "olha, eu gostei de você, mas não dá não. A gente tem essas chances de 10% de ficar juntos, e eu não quero tentar, não quero sofrer, não quero. não quero" esperneei, como criança birrenta, mimada que eu sempre fui. Aí você não me apareceu com flores, me negou todos os poemas e descambou a me mostrar realidades. Me levou pro café, me mostrou sua alma sem querer, me emprestou todo seu universo dentro de uma caixinha e me deu de presente. E depois que alguém dá o universo pra alguém, eu sabia - e todo mundo sabe - não tem volta. Mesmo no meio da minha sensatez, um dia eu te olhei e dentro daqueles teus olhos tristes eu vislumbrei todo o meu futuro, com as minhas xícaras de café bem postas numa mesa que eu tinha acabado de imaginar. E depois que imaginei não quis outra coisa que não todo o resto dos meus dias preenchidos com café naquela mesa que eu tinha acabado de imaginar. É tudo tão louco nesse mundo, quem ia imaginar que um dia eu ia esbarrar em você e depois dessa minha mania tonta de falar mais do que eu devia, a gente ia descobrir uma afinidade eterna? Pois é, foi assim, tudo tão ridículo e sonso. Um dia eu dividi o refrigerante com você e meses depois minha vida toda já estava nas suas mãos, e eu só sorria quando você sorria também. Que loucura saber comprar seus biscoitos preferidos no mercado, trocar minhas bolachas integrais de aveia pelas suas de chocolate, justo eu, que nunca me deixei atrasar dez minutos na vida por causa de outra pessoa, estava ali, atrasando meus planos todos pra que eles começassem a andar junto com os teus.

Hoje eu leio tuas cartas e sei, que tudo aquilo era pra ter dado certo desde a primeira vez. Cada palavra sua só ia caber em mim, e se eu ainda escrevo, é pra você. Todas essas pilhas de cartas sem endereço nem remetente, endereçadas à você no coração. Mas aí um dia você levantou e foi, não olhou pra trás. Quem você pensa que você é pra desarrumar minha vida assim, pra deixar minha mesa sobrando uma xícara e meu coração com um buraco imenso. Sou eu quem empurro o prato, eu que digo não-quero-mais. Eu que largo o certo em busca das aventuras, eu que racionalizo amor porque fazendo contas de a + b acho que seria mais feliz com c e aí vou, derrubo tudo, desalinho a ordem do universo, arranco mais um grande-amor que não é meu da mão de outra pessoa e faço um caminho todo pra santiago de compostela esperando a paz, a paz, o amor, a loucura. Mas aí você vem, me explica, com toda a calma do mundo, como se amor fosse jogo de medir, de somar de calcular e vai embora assim "querida, você precisa alcançar o mundo e eu sou uma cidade no interior". E eu querendo dizer que eu já tinha virado uma fazendeira, calçado as minhas botas, que estava farta do mundo, que eu iria viver em cima de uma montanha que fosse porque meu universo todo estava nas suas mãos. Mas você se recusou a ouvir e foi embora levando meu mundo, porque "eu sou muito pequeno, e você é grande demais pra caber aqui".

Hoje lá está você vivendo pequeno, e cá estou eu, sem mundo. Tem um universo todo pra desbravar e eu morando num quarto-e-sala no centro que não faz o mínimo sentido sem a sua xícara em cima da mesa. Quanto tempo, quanto tempo vai até você perceber que eu só sou grande porque você me deu seu universo e que não dá pra desbravar lugar nenhum, porque rapaz, você é o meu mundo. Resumitivo e reduzido assim, eu só sei enxergar o mundo lá fora se olhar pros teus olhos, senão eu me perco. Eu tinha tudo aqui dentro. Tudo. Tudo tão completo, tão cheio de vida, tão nascendo flores e violetas, gérberas, orquídeas. Todo um caminho rumo ao universo inteiro de paixões e sentimentos que eu ainda estava por provar, e meu querido, tinha que ser com você. Agora você me vai, dono da verdade, me deixa sem chão pra ir morar pequeno porque teu mundo é pequeno. Meu deus, você é imenso. Tão imenso que abriu em mim um mundo, um espaço, um buraco-negro do sentir. Que enquanto você não voltar, vai ficar resumido nessa pequenez sem fim. Nesse acordar vazio, nesse ir dormir sem vida, nessa falta de vontade de olhar pra fora porque você levou com você a minha paz. Minha paz, meu mundo, minhas bolachas integrais de aveia, minha xícara de café. Teu quarto tá arrumado esperando você voltar. Pra quando você voltar num dia de frio ou de calor, cheio de doçura ou de dor, não importa. Vai ter café na tua xícara azul, e atrás da tua cama tá escondida a passagem pro mundo. O mundo que você queria me dar, mas que levou com você no dia em que se foi. O mundo que só se abre com meus olhos no teus, minha mão na sua, no sonho que a gente sonha juntos debaixo das estrelas apagadas que a gente vê da janela no nosso apartamento pequeno. Eu juro amor, eu sou capaz de alcançar o mundo e um pouco mais, com a ponta dos dedos. No dia em que você voltar. Me olha no fundo dos olhos, me devolve meu universo, que eu juro, amor. No dia que eu te conheci, você me deu meu mundo, meu universo, a felicidade. O mundo já é nosso, amor. O mundo sempre foi nosso.

15.12.10

A gente quer ver, o horizonte distante.

Ah, se você soubesse como eu odeio dizer tudo isso que fala de mim. Como eu adoro me esconder no meio de meias-ficções. Eu chorei tanto esse ano que passou, chorei tanto essas ausências. Tanto. Choro ainda. Acordo e choro. Choro antes de dormir também, choro de vezemquando de quando em vez. Lembrando. Eu perdi tanta coisa e estou aprendendo a viver nos entremeios. Com aquilo que sobrou. As pessoas, os lugares, tudo mudou tanto-tanto. Eu tenho vontade de te ligar e dizer "ele foi embora, e às vezes eu me sinto tão sozinha". Você ia me entender, eu sei que ia. Ia me levar pra tomar um cappucino, e não ia saber lidar com a minha tristeza. E tanto faz. Eu nunca precisei de muito de você além da certeza do estar. Eu queria ser feliz, cara. No meio disso tudo, eu queria ser feliz. Mas não dá. Me falta. Me faltam as ferramentas para. Às vezes as pessoas são doces, às vezes eu acho que não preciso de mais nada da vida. Mas preciso sim. Tem tanta coisa faltando aqui-e-ali. Mas não é sempre que dá pra se perceber. E quando eu percebo, dói.

Enquanto isso, eu acho que você ia se orgulhar de saber que eu tenho tentado ser uma pessoa melhor. Eu tenho tentado agüentar tanta gente no meio dessa vida. Tanta gente que eu tinha prometido pra mim mesma que não ia trocar mais do que um "oi, tudo bem". Você ia rir se eu contasse. Ia rir ou ia achar triste, eu não sei bem. Às pessoas tem coisas boas quando você para pra olhar,sabe? É que no fundo ou elas são um pouco tristes, ou são inseguras demais, ou elas forçam demais pra serem legais. Às vezes elas só são diferentes de você e de mim. O que renderia boas piadas que a gente não conta, só olha enquanto saia com elas. Mas eu estou tentando relevar mais. Toda essa minha criticidade que você tinha medo. Não sei se tem espaço mais. Eu tenho tentado encontrar o nirvana, outro deus, a paz, qualquer coisa que seja. Eu preciso. Não agüento mais fazer as pessoas sofrerem. Eu tenho gostado muito de observar as pessoas, conhecer. É que depois que você se foi parece que eu preciso de umas trinta mil pessoas. Cada uma pra suprir um aspecto seu diferente. Eu tenho ouvido umas coisas diferentes também. Frequentado outros lugares. Não sei se é bom não, mas é diferente. Eu tenho me aventurado sem você. Sozinha. Eu tenho ficado muito tempo sozinha ultimamente. Desde que você se foi, eu me sinto sozinha no meio dos outros. Como aquela amiga que o marido morre e as pessoas ficam levando pra passear pra ver se supre a falta. Acho que você ia sorrir ao saber que as pessoas mais improváveis do mundo tem me estendido a mão. Acho que ia estranhar também. Ia estranhar eu chorando ao cantar a música que nunca foi nossa. Tem tanta coisa que eu queria te cantar ainda, acho que eu choro as saudades. Eu te cantaria todas as músicas que eu ouvisse, até as que eu não gosto. A gente costumava não gostar juntos.

Eu costumava gostar dos nossos desencontros. O descompasso tremendo em que se fez a nossa história. O tempo errado em que tudo se fez. O jeito com que você sempre chegou fora do tempo. Amor, você só sabia chegar atrasado em todos os lugares. E eu ficava ali, te esperando. Eu, sempre uma metadinha sem você ali, esperando um complemento. Se você quer saber, eu nunca mais sorri do jeito que eu sorria quando estava com você. Esses dias eu sorri sozinha, te lembrando, e lembrei também do sorriso que eu nunca mais dei. Eu fico com tanto medo de ninguém nunca mais preencher as minhas mãos do jeito que você preenchia, eu tenho tanto medo de tudo desde que você se foi. Medo da vida, do improvável, medo do acaso também. Eu tenho medo de que as pessoas que eu encontre na esquina não sejam iguais a você depois de duas conversas. E quando eu saio pra dançar, não posso mais te cantar as músicas que você ama odiar te declarando meu amor das formas mais improváveis. Eu tenho bebido cerveja demais sem você, e tenho evitado a que você bebia comigo por medo de chorar. Eu tenho evitado a minha vida um pouco, pra te dizer a verdade.

Esses dias eu refiz uma via crucis de nós dois. Andei sozinha no lugar em que a gente se conheceu. Sem música, sem nada. Chorei ouvindo meus passos. As pessoas em volta não entendiam nada. Não tem porquê. Um lugar no meio da rua, no meio da cidade. Silêncio. Faz um silêncio enorme em qualquer lugar que eu vá sem você. Todas as bandas que a gente ouvia juntos sentem saudades. Os quadros de casa, os pedacinhos de cidade. Eu te ensinei tanta coisa, você me ensinou tanta coisa também. Tem tanto livro teu, tanta coisa aqui, deve ter até roupa. Tem tanta coisa sua dentro de mim. Às vezes eu espero notícias. Espero só que você esteja sorrindo ainda do jeito que você me sorria até antes do dia que eu te vi partir. Eu espero que você esteja sonhando com alguém tomar café em paquetá. Eu não sonho com ninguém mais não. Eu sonho com viagens, sonho com tanta coisa amor. Mas a mão do lado ali, não sonho mais não. Acho que eu vou sozinha. Não tem como dividir um chalé com alguém e não querer você. Vai tocar qualquer música que não seja nossa e eu vou fazer com que seja, eu vou chorar, mas deixa.

Deixa que o mundo é grande, nossa história é tão imensa. Você chegou tão atrasado tantas vezes. Acho que você atrasou pro nosso final feliz também. Ah, amor, as pessoas sentem tanto a sua falta aqui. Sentem a falta de nós dois, às vezes, eu acho. Eu me perdi tanto desde que você foi. Eu não sei se você ia continuar me achando a coisa mais linda do mundo. Às vezes até eu deixo de me admirar. Mas tem reticências ali no fim da nossa história, eu não consegui dar ponto final nenhum quando você foi embora. Ainda tem um bocado de sonho, tem umas tintas verdes pra pintar as paredes e se você quiser a gente compra uma casa com um quarto decorado só pra você trabalhar. Eu ainda faço o café do mesmo jeito, ainda não deixei pra lá a mania de fazer brigadeiro depois do almoço. Eu continuo não comprando os livros que eu sei que você tem pra não fazer uma estante repetida. E eu nem consegui repor aqueles que você levou. É que um dia eu acho que você ainda volta com eles, com teu sorriso e bota de novo nossos sonhos pra funcionar. Eu ainda tenho chá pra sua dor, amor. Ainda não aprendi a dormir sozinha no frio e não vejo graça em ir no cinema com os outros. Não sei a medida exata, sempre sobra salgadinho e chocolate pra levar pra casa. Não sei mais a medida exata dos meus passos, dos meus sonhos e nunca mais consegui ocupar o seu lugar no sofá. No coração então, ai.

Todos os livros que eu li, amor, todas as coisas que eu passei não me fizeram inteligente o suficiente pra te superar. Eu ainda te vejo entrando por aquela porta, eu não sei quando. Eu estou tão em paz com tudo, às vezes eu danço, às vezes eu rodopio sozinha. Eu tenho visto tantas coisas lindas nas pessoas, e às vezes faz o por do sol mais bonito do mundo aqui da janela, amor. Eu tiro fotos dos mais bonitos esperando que você volte. E eu sei, que tudo soa triste. Eu sei, as pessoas tem uma certa pena de tudo isso que eu vivo falando. É que as pessoas não tiveram grandes amores. Você sabe que não. Você sabe que todo mundo que a gente conhece festejava a gente e não era inveja nem cobiça, elas eram felizes por nós. E a gente era feliz pela gente. E eu acho que um amor imenso desses não acaba assim, rápido, como quem se joga do décimo andar. Então amor, espera, acalma, a nossa vida acabou de começar. E vai ter uma sala de tv e uma biblioteca. Aos domingos a gente pode esperar o sol nascer, depois ir na feira. A gente pode ver todos os filmes do mundo às terças e sair pra jantar nas quintas. Eu te faço almoço pra quando você chegar do trabalho, eu te levo pra tomar um suco e a gente toma sorvete de sobremesa. Eu deixo uma rosa crescendo no jardim pra quando você voltar, porque eu sei que você não vai deixar ela morrer. Amor, você só está atrasado.

14.12.10

Goodbye, my friend.

Eu deveria talvez, quem-sabe, ter te felicitado por suas grandes conquistas imensas como costumo fazer ano-após-ano. Eu deveria, quem sabe te convidar pra um café que viesse a se concretizar daqui a dois meses, ou três anos para que me contasses sua vida, porque nada sei mais da sua vida. Sei que sorris. Vez ou outra te vejo sorrindo, abrindo seu lindo sorriso cor de céu. Você tem um sorriso grande, um sorriso imenso, uma felicidade cor de esperança nos olhos. É bonito de ver. É bonito de imaginar você sendo feliz de não caber. É bonito te pensar realizando sonhos, construindo casas, destruindo quartos para fazer novos quartos e guardando dinheiro para construir castelos que entoem chegar até o céu. Você sempre quis, eu sei, você nunca sonhou com nada menos que o céu, estrelado, bonito, cor de verde água. E talvez, no meio da minha vida conturbada, eu deveria - como fiz sempre - achar um tempo para que você me conte tudo aquilo que te faz feliz, e também quem sabe, alguma coisa que te faz triste. Porque deve ter, no meio desse verde imenso que forma o mar que por sua vez forma a sua vida, alguma tristeza encroada. Todo mundo tem. Até você no meio dessa vida que você pediu sabe a qual entidade - e que diz ter conseguido com o esforço que lhe coube - tem alguma coisa pra chorar. Eu não sei sobre o que, porque, eu não sei mais nada da sua vida.

Eu teimei. Teimei muito tempo em não querer admitir, mas a gente se perdeu. Não sei quando foi a data exata, mas eu não caibo mas nessa sua vida cor de fantasia. Não adianta, não caibo. Não tenho brio, não fui feita com a matéria de quem larga vidas à procura de grandes amores. Não sei me despegar assim do universo-ilha que eu criei. Não sei. Não sei voar pra longe e perigar bater com o nariz na parede. Eu não sei sangrar e mesmo assim espero o universo. Você não sabe como é isso. E meu universo, meu universo eu não fiz numa casinha em cima de uma árvore com um filho, um marido e um cachorro. Porque meu universo contempla um universo inteirinho e nesse universo inteirinho tem países que eu ainda não conheci, e cidades que eu ainda quero desbravar e por mais, eu te digo, por mais que eu queira a paz de um grande amor, minha vida não é feita dessa matéria apenas. Eu sempre quis mais, e hoje, você já não sabe mais entender isso. Só quer que eu me desapegue, me desapegue, me desapegue e já não cabe na sua vida, minha vida conturbada. Eu sempre fico ali, no pedacinho que sobra - quando sobra - no seu conto de fadas. Sempre num intervalo e quando eu começo a precisar mesmo de você, você se vai. Sempre com aquela frase, tão típica "você me entende né?" e olha, eu tentei. Eu tentei o quanto que deu entender que as coisas estavam difíceis, mas sempre pensei que depois de um tempo as coisas iam se ajeitar.

A grande verdade é que não, eu não te entendo não. Eu sempre arrumei um tempo, seja na felicidade ou na infelicidade ou até mesmo quando eu estava construindo castelos que tentavam ir ao céu, pra você. Porque no meio das outras coisas, e não só no meio, junto, é essa a palavra jun-to com as outras coisas, você sempre foi a coisa mais importante da minha vida. junto com meus grandes amores, quando eu construía um castelo, tinha sempre um quarto pra você pra quando você quisesse me visitar. É que eu te enfiava no meu universo-ilha, no meu universo-grande no meu universo-papel eu te enfiei na minha vida porque você fazia nascer em mim um amor fraternal que eu nunca experimentei. Eu nunca tive irmãos, irmãs, nunca tive amor demais, nunca tive entrega que não fosse amor-amor, amor eros de homem e mulher mas aí você apareceu, me deu uma vida e de repente me tirou tudo de volta. De repente a culpa nem é sua, mas é que eu quero paz e no meio dessa paz e de um universo todo que eu quero conquistar eu quero também reciprocidade. Estou cansada de te mostrar mil bandeirinhas brancas e você não ver porque você construiu um castelo, uma casinha na árvore com um céu azul esverdeado. E tudo bem, eu sempre quis que você fosse feliz. Eu te abriria mil caixas com a minha felicidade e dividiria com você.

Mas só que você não tem mais tempo. E eu não agüento mais você me dando conselhos no tempo que sobra. Não agüento mais você me dizendo que eu só vou ser feliz no dia que tiver uma vida igual a sua. Eu também quero construir um castelo, uma casa na árvore, no campo. Também quero que ela chegue até o céu. Só que eu vou tijolo por tijolo porque sou feita da matéria de que são feitas aqueles que se doam, e às vezes paro de construir meus sonhos só-meus pra sonhar com pouco meus-sonhos-com-outros. E sou feliz assim. Um dia meu céu também vai ser super-azul, e quer saber, ele já é. É você quem me olha com pena porque acha que eu só vou ser feliz o dia que encontrar aquilo que você encontrou. Só que a gente é diferente Você não aguenta que seus céus fiquem cinzentos e dai corre a procura, desbravando quem seja, rápido, rasteiro, correndo, num impulso, querendo nada menos que a felicidade -inteira, achando que tristeza é mato, é vergonha que eu tenho que correr pra onde seja, largando o que quer que seja só pra ser feliz , porque você não suporta um céu acinzentado. E eu, eu sei que os meus vão ficar cinzas de vez em quando. E sei que por vezes vou abrir a janela e vou sentir vontade de chorar, de correr, de largar tudo em busca de um céu azulzinho, mas depois vai passar e eu vou devagarinho, no meu ritmo, pegando ajuda aqui e ali, porque eu aprendi a lidar com o fracasso muito cedo. Inclusive com o nosso. Esse fracasso que você daí de cima do seu castelo no meio do seu céu azul, nem percebe que veio. Mas veio. E agora, meu bem, eu só peço com força pra qualquer entidade que-seja pra que você continue azulando céus mundo afora, e que eu consiga ser feliz devagarinho pra quem sabe ser feliz pra-sempre. Mesmo que você não esteja mais aqui pra compartilhar comigo. Mesmo que você nunca mais segure a minha mão.