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20.6.10

Na minha coleção de pedras

Foi quando eu descobri estar completamente confusa pra te dizer qualquer coisa que seja, que resolvi calar. Te calei ali, na frente da geladeira, na porta da frente, nas faixas da rua e no seu chocolate preferido, tudo isso que me faz te lembrar e não querer te sentir nunca mais embora eu não queira na realidade te perder de mim, dessas coisas, sabe? Desse pensar em você pela manhã e imaginar que talvez-quem-sabe num futuro distante eu esteja acordando nos seus braços e pensando que podemos ter filhos daqui dois anos quando eu terminar minhas coisas e você estiver um homem quase estabilizado. Eu fico pensando em tudo isso que me faz falta, esse seu abraço estranho e essa segurança que eu tinha que se o todo mais falhar eu te tinha, ainda que eu te ligasse e você nem me ouvisse direito, só concordasse comigo e risse, daquele jeito escandaloso que você sempre riu de mim e comigo mesmo no meio das minhas piadas sem graça e da minha depressão. Eu te lembro sorrindo e te lembro no dia que eu percebi o tamanho da nossa cumplicidade, eu já te entendia pelo olho de um jeito que não pode nenhum ser humano entender a outro a não ser que se enxerguem mutuamente muito mais do que por fora, por dentro e por almas e tudo isso. Eu sinto saudades do dia em que te descobri e de todos os outros dias em que eu te descobri mais um pouco e quase quero amaldiçoar o dia em que eu te olhei sabendo que eu te conhecia, mesmo que você ainda esperneie dizendo que eu tenho a visão errada sobre você. E eu sei mais de você do que você mesmo, isso que me deixa louca, sabe? porque daí eu não posso nem te odiar sem te dar pelo menos trinta justificativas de porque você está agindo assim. Eu te olho e só tenho vontade de te dizer "eu te entendo, eu te entendo mesmo." e te abraçar forte, pra ver se de algum jeito sai essa parte toda sua em mim que é tanta, meu deus, como existem partes suas em mim, é quase uma simbiose de existir. Eu sei até enxergar as coisas com o seu olhar, você nem sabe, mas eu ainda faço listas imaginárias de coisas que você possivelmente ia gostar, que nem eu fazia logo que eu te conheci, em que só importava que a gente se impressionasse mutuamente de um jeito que um achasse o outro o ser humano mais interessante dentre bilhões de pessoas, e dissesse: "são todos piores que esse aqui" e então quisesse ter ao outro como uma espécie de presente, de prêmio: "eu possuo a espécie mais rara de ser humano que pode existir". E é como fazer uma coleção de pedras, em que um dia você escolhe uma pedra preferida, porque as pedras não tem valor nenhum pra outras pessoas, mas é a sua pedra preferida então ela brilha e se transforma e parece uma espécie de tesouro e você era essa pedra aí, a pedra mais brilhante da minha coleção, meio malfeita, mas que eu poli e amei tanto que não existe como agora dizer que eu não tenha por ela um apego mais do que sentimental, é tão rara a pedra. E as outras pessoas olham e só pensam que é uma pedra. Você sabe, as pessoas te olham e te acham esse cara aí capaz de parecer com qualquer outro cara, e te tratam tão normalmente, e até mal, porque você pra ela é uma pedra como todas as outras, dessa que a gente acha perdida no meio da rua e passa meio reto, depois pega porque num relance teve um desejo. Eu nem queria falar de pedras, eu queria é falar de você, te ligar como a sei lá quanto tempo atrás e te chamar porque eu estou me sentindo sozinha, porque todas as outras pessoas sentadas na minha sala são erradíssimas sem você, porque com você eu ia poder sorrir e ia poder ser plena, meu deus, eu nunca mais fui aquilo que eu era desde que você se foi. Eu olho pras pessoas e sinto falta falta falta meu deus é tanta falta pra uma pessoa do meu tamanho. Porque antes era uma falta dessas assim, pequena, quase que boa porque era como se você fosse chegar a qualquer momento, abrir a minha porta e me fazer rir de novo, como nunca, mas agora? agora você nunca mais vai entrar por porta alguma, e fica ai essa ausência que eu já preenchi com tanta coisa, com novos amigos, com bebidas, comidas chocolates e todo meu problema eu sei, é falta de você. Certeza de saber que eu não posso mais ligar, ou te chamar e nem trocar cinco palavras com você eu posso, eu nem posso te dizer "caramba, eu sinto saudades de você, seu idiota" como eu fazia antes disso tudo acontecer, porque agora ficou tudo tão estranho, sem propósito, eu nem sei o que eu faço eu senti tanto a sua falta esses dias, tanto. Eu quero explodir o resto do mundo só porque eu sinto falta de você, eu sinto raiva das outras pessoas a minha volta não serem você, porque elas nunca vão ser mesmo que elas tentem. Você era assim, você. A pedra mais preciosa da minha coleção, o tipo de ser humano que eu que vem com uma etiqueta "a espécie mais rara de ser humano que pode existir". E lá estão as outras pessoas com essa espécie rara de ser humano sem nem se darem conta, fala pra elas, explica que é algum tipo de pedra preciosa que você é, fala pra elas cuidarem bem de você já que eu não posso. Faz tudo isso enquanto eu tento viver com esse monte de gente, sabendo que eu já possuí a espécie mais rara de ser humano que podia existir, e que ela se foi e que enquanto eu não encontrar ela de novo, tudo que eu vou saber fazer é me perder e me perder nesse caminho sem saída que eu entrei e que parece não ter mais volta e que só você (sem saber) tinha o mapa.

Amor que nada, o que eu sinto por você ainda não tem nome.
(Transcende)

2 comentários:

carlos massari disse...

as pessoas sempre se idealizam e tentam transformar aquelas que amam em pedras preciosas. depois que elas se vão, a tentativa é maior ainda.
mas, no fundo, todas são as mesmas pedras sem valor. todas.

Luciano Costa disse...

"Eu te olho e só tenho vontade de te dizer 'eu te entendo, eu te entendo mesmo.'"