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8.8.11

Maldita seja a distância entre nós.

eu sinto saudades daqueles rabiscos, sabe. dos meus também, um pouco. eu tinha menos, é claro. bem menos que você. É que a minha vida era mais bagunçada. Gente bagunçada demais não dá conta nem de rabiscar direito e costuma encarar vazios. Hoje é a minha parede descascada e o meu teto branquíssimo. Engraçado, né? Um pequeno pedaço de casa vira de repente um universo. Às vezes eu acho que o tempo passa e a gente cria mesmo um mausoléu. Sabe, as coisas vão morrendo e aí a gente joga as cinzas aqui e ali ou enterra mesmo. Fica numa esperança louca que as coisas que passaram, assim com acreditam os budistas, passem por uma espécie de roda de samsara e renasçam (melhores).

Bendita seja a distância entre nós. Distância que foi se configurando aos poucos, e quando a gente se deu conta estava em outra vida. Vez ou outra eu sento na mesa e ainda sinto cheiro de lasanha, ou pavê, ou sorvete de flocos semi-derretido. Fico pensando quantas relações ainda serão constituidas de puro vazio até chegar perto dessa coisa que já existiu. Tudo parecia simples, e bobo e até um pouco infantil. Porque era comum. Nunca achei que um dia eu iria acordar e estivesse tudo assim, meio desmanzelado. O universo não parecia assim tão deserto de almas naquela época. Porque gente tem. Gente tem de monte, andando nas ruas, comprando coisas, enchendo sacolas, jogando lixo, indo nas academias, comprando carros novos ou até mesmo passando fome. Tem muita gente no mundo. Agora alma sei lá. E fica até meio clichê isso, a gente reclamando de alma, de essência, de vida. Um dia eu expliquei pra vocês que a pós modernidade estava chegando. E olha, chegou. Um indvidualismo tão louco, né? A gente parece parte de um mundo que já existiu - e que não volta.

Penso em vocês na sacada, penso na gente, poxa, na gente falando tanto sobre nós mesmos. E enormes momentos de silêncio e pausa, de violão de poucos acordes, de suspiros longos. Amar não é concordar o tempo todo. Amar não é nem mesmo amar o tempo todo. Eu já odiei vocês. Já quis que vocês sumissem tal qual os balões de cinza que jogamos da janela. A vida é um pouco isso né. Esses balões de jornais que sobem bonitos depois queimam no chão. Acho que queimamos um pouco no chão, não sei se sobe. Não sei se agora existe um jeito de dar a volta, um retorno desses que bota a gente de novo na estrada onde tava e refaz o caminho. Parece que não. A gente já bebeu menos, já se acabou menos, já comeu menos. A gente já foi mais a gente, sem se auto destruir. Amor mesmo, sabe, amor de verdade já embriaga por si só. E a gente era meio embriagado, meio embriagado de sentimento.

Às vezes a vida doia no meio dos copos de coca. O mundo passando, as pessoas comprando mc donald's em volta e a gente tentando entender que vida era aquela, o que o mundo estava fazendo dele mesmo, porque é que a gente não conseguia fazer parte, jogar o jogo, ser parte do time. A gente ainda não consegue, mesmo separado a gente sabe que não consegue. Que não conseguirá. Só que as crises agora são longe, e eu sei que meus copos só estão assim, até a borda de tanta cerveja porque eu não tenho mais vocês. Não do jeito que era antes, não dá mais pra discar o numero de vocês e dizer que tudo bem, a vida é uma merda, ninguém se ama mais só que a gente tem a gente, e uma travessa de macarrão e um pote de sorvete. A gente tem a gente e pode gritar da sacada, e pode segurar a mão um do outro, mesmo que de um jeito metafórico, mesmo que a gente nem saiba nada sobre os contatos físicos imediatos.

O que é a vida agora senão um erro? a gente se perdendo, perdendo o trato com as pessoas. A gente se convencendo que nunca quis muito ser feliz, né? a gente nunca quis, não muito, tá bom assim do jeito que tá. Meio caído, meio vazio, cheio de coisa errada, mas a gente vai levando. O pedro não podia achar ninguém melhor que a mariana. A fernanda não podia achar ninguém melhor que o cristiano e ok, tá tudo bem nesses namoros sem amor que a gente leva, nessas noites cheias de "diversão" que a gente tem. Uns brincam de amar, os outros se jogam da sarjeta, eu cansei de brincar de amor e caio na sarjeta. Às vezes eu acho que vocês também ficam em casa, olhando o teto, as paredes descascadas, o universo-quarto de vocês e sentindo saudades do que a gente era. Às vezes eu acho que a gente deve abrir ao mesmo tempo o facebook um do outro e pensar em perguntar como vai a vida, se você continua gostando de macarrão com molho, de sorvete de flocos meio derretido, se ele continua esse desastre social cheio de mancadas.

Mas tem os namoros, os quase-casamentos, os trabalhos, as faculdades, as distâncias, as mudanças que vem com a vida e a gente se perde mesmo, né? E o que sobra é isso. A melhor época das nossas vidas eternizada numa foto granulada e escura em que ninguém saiu muito bem, mas eu juro que estávamos felizes. E tudo que eu queria era juntar todos os pedaços daquela foto depois de dez anos e nos ouvir realizados. Mas nós sabemos que não vai acontecer. Não tem como ser feliz depois de ter se perdido tanto. Não tem mais alma nessa vida que a gente leva. E sem alma, não tem nada.

E o pior de tudo é saber que continuaremos. Mesmo com dor, mesmo sem alma, mesmo sem ter pra quem contar a vida, mesmo levando a vida só pra gente. Mesmo guardando o peso sozinho, carregando a cruz sem saber bem pra onde. Mesmo infeliz e sabendo disso. É que não tem outro caminho a não ser continuar. É que continuando talvez a gente se encontre, desavisado, na mesa do bar ou debaixo da ponte, procurando aquele mesmo retorno que vai nos botar de volta no caminho certo.

Oxalá.

(eu não sei se sinto mais saudades de vocês, ou de mim. Maldita seja a distância entre nós).

Um comentário:

patty. disse...

Você não tem tumblr? se tu fizer, anuncia aqui, sei lá por que vou amar te dar reblog, teus textos são maravilhosos! Parabéns, de verdade. Sempre me identifico muito com textos de amor eterno, distância, saudade... Parabéns de VERDADE, moça!