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26.11.10

C'est la vie.

Eu sai por aí pensando você e balbuciei tantas vezes "tudo poderia ter sido tão diferente, garoto, tudo poderia ter sido tão doce." Hoje eu poderia estar andando de mãos dadas com você rumo à lugar nenhum, ou podia quem sabe te improvisar um almoço antes do trabalho, nada demais, um bife, macarrão dois copos de suco e sorrisos. Mas a vida é assim "c'est la vie" eu te diria, mon ami, e você não entenderia nada da minha mania de falar francês sem-saber, como também não me entende na minha língua natal, e como desentende completamente meu coração. E eu responderia "é a vida, meu amigo. Só que em francês pra dar um tom dramático à coisa toda". E mais uma vez você me acharia doce demais, inteligente demais, e tudo demais demais pra que eu pudesse dividir um caminho do seu lado. Eu indo sempre na frente, mas que frente é essa também. Eu sou tão loser, garoto. Toda perdida, hoje quero ficar de pernas pro ar e amanhã vou querer o mundo, depois vou desistir do mundo e querer só uma partezinha.

Eu desisti da sua vida, da minha vida, da nossa-vida principalmente eu desisti. Transformei tudo em literatura, tudinho. É que eu não sei viver, não sei mesmo. Tentei algumas vezes sem sucesso e viver pra mim pareceu uma aventura errante, como essas crianças que tentam dar o primeiro passo, se estabacam no chão e resolvem que vão engatinhar mesmo, não há outro jeito. Só que as crianças ainda levantam e vão, e eu, por vício estou aqui de muletas. Só sei andar com elas, e as minhas muletas são as palavras. Eu sei, você tem uma vida, e toda vez que eu me dou conta disso eu volto a engatinhar, porque eu não sei como existe essa coisa de vida e tudo-o-mais, essa coisa de você existir físico em gestos, pele, cabelo, roupas, cheiro. Enquanto eu penso todas essas coisas eu me pergunto porquê não houve um diazinho que fosse que eu te dissesse em as palavras de verdade "eu gosto muito de você" ou "você é muito importante pra mim". Ou mesmo que não tivesse dito nada, tivesse demonstrado em forma de qualquer-coisa-mais do que meus olhares sempre baixos, desviantes, tímidos e principalmente, disfarçados. Você tentava falar de amor e eu fingia que amor era jogo de outra pessoa, de você-com-outra-pessoa. No fim era mesmo, e pra mim, ah, pra mim, amor é jogo meu com as palavras. Eu desisti de viver e hoje só invento histórias. Essa minha vontade de te dizer que "tudo poderia ter sido tão diferente, garoto, tudo poderia ter sido tão doce" não passa de fantasia, porque eu tenho todo um mundo de coisas minhas, de coisas suas que não aconteceram. E aqui, mon'ami, tudo é terrivelmente possível. Seria absolutamente possível que eu te ligasse e de dissesse "eu ainda te amo" e então você me responderia "que apesar de tudo eu ainda também te amo" e então nos amaríamos em belas tardes com sucos, almoços simples, almoços requentados, tardes de domingo no sofá, qualquer coisa dessas assim, rotina, corriqueira, bonita-nos-pequenos-gestos.

Mas não é assim, hoje eu penso em você que talvez nem exista no corpo físico do jeito que eu te imagino ser, só existe aqui na minha literatura. Porque enquanto eu penso que "tudo-poderia-ser-diferente" "tudo-poderia-ser-tão-doce" você cuida da sua vida, real, em qualquer lugar onde eu não pertenço nem em pensamento, toma um guaraná, e pensa no teu trabalho, na sua vida, na sua namorada, em qualquer-coisa-que-seja. E pra mim tudo bem, é que eu matei a minha vida. Transformei em literatura. Escrevo sua vida pra você, do jeito que eu-queria-que-fosse e você não me entende e C'est la vie, mon'ami.

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