Páginas

26.2.12

Desculpa se te chamo de amor.

Sinto muito sono na Campinas que não é (e nunca foi) minha, e torno-me então esse ser incapaz de dizer qualquer coisa que seja - dessas coisas importantes que são necessárias dizer de vez em quando - e desisto de escrever sobre meu voo atrasado, as velhas que se amontoaram medrosas, as turbulências por entre as nuvens. Me sinto incapaz. Meus olhos fecham de cansaço e me sinto exausta. Foram muitas horas sem dormir, e um domingo inteiro passado nessa terra de ninguém chamada aeroporto. Tive muito pouco tempo, em meio a fome, a sede e a irritação com as brigas dos meus pais para que pudesse pensar nessas coisas da minha vida, essa minha vida sempre confusa. Sei que me excedo, eventualmente, e sei que tenho esse vício inconsciente de ferir de algum jeito meio esquisito tudo aquilo que sei que posso vir a amar. Tenho muito medo. Um medo que não posso te contar porque não consigo nem entender direito e de repente me sinto cansada sentada naquelas cadeiras desconfortáveis e cinzas, em frente à um menino que ronca quase como você. Eu queria te dizer várias coisas, mas sempre acabo desabafando desse jeito meio errado e usando as palavras inadequadas.

Talvez eu quisesse brigar com você, te ferir de verdade, te machucar de um jeito muito profundo, pra que você sentisse vontade de me machucar também e aí, quem sabe, eu pudesse sair correndo de você com um motivo quase-concreto. Talvez você faça a mesma coisa, essa defesa esquisita, de sempre usar as meias palavras pra tentar dizer aquilo que queríamos dizer, ou talvez não seja nada disso, você sabe, eu tenho muito sono. Muito sono mesmo. Tenho tanto sono que de repente sinto vontade de deitar na sua cama apertada, no seu quarto quente e cheio de pernilongos, e chorar no teu peito molhando sua camiseta branca. Eu choraria sem saber porquê, mas seria um choro sincero, esses choros que vem de sentimentos que a gente não explica direito, que vêm dessa vontade de se sentir em casa. Eu quis sair da minha casa porque me sinto melhor na estrada. É bom não estar em casa nenhuma que seja minha porque assim eu tenho a impressão de não estar morando no lugar errado. Estar no meio das nuvens era mais reconfortante do que estar no meu quarto. Eu me sentia livre. A liberdade que eu não tenho naquele edredom de flores que nada tem a ver comigo, que eu não tenho naquele calçadão de londrina já tão diferente do da minha infância.

Te via dizer que me queria nos seus cafés de domingo, ou na sua tarde vazia e fazia um pouco caso quase ensaiado. Eu queria não te querer de volta. Eu queria não querer acordar com você na sua cama apertada e tomar café na sua padaria preferida, e almoçar em meio a garçons que não nos atendem e pratos que vêm errado. Eu queria não sentir medo de te perder, assim, clichê como são os meus textos de mulherzinha. Eu queria confiar que a vida, traiçoeira, não vai nos separar na próxima esquina, ou no próxima vez em que você for apresentado à uma garota nova, e ela quem sabe, não amarrar a camisa jeans do jeito errado por cima do vestido. Eu queria não querer de novo os sábados e os domingos, e até as terças feiras em que você dormia enquanto eu sentia aflição, porque você não sabe, mas eu tenho aflição de ficar acordada sozinha, em qualquer lugar que seja. Tenho também muito medo da vida dar errado e tenho também muito medo daquilo que sinto, porque gosto um pouco mais de ser eu-lírico na vida, inventando sentimentos que na verdade não existem. Eu não sei se alguma coisa existe de verdade assim, concretamente, mas sei que te agrido sem querer toda vez que percebo que você está distante demais desses meus braços magros que precisam de abraços todos os dias ao acordar. Te agrido só porque queria você mais perto, porque queria estar no fim dos seus dias cansados pra te fazer um chá, um café, uma salmoura. Me dói ver você recebendo notícias tristes e não poder te abraçar, tem me doído a distância, e ela já não dói física, dói por me privar do poder-estar-presente em qualquer coisa mais do que mensagens de celular e comunicações mediadas via aúdio e vídeo. Me sinto impotente. Te agrido porque tenho medo de estar querendo errado, e acabo por sucumbir a joguinhos infantis de quando tinha dezoito anos e não sabia amar.

Ainda não sei amar. E tudo isso soa débil. E esse texto é débil. E eu sou débil. E o amor é débil. Mas o amor existe, enfim? Esse assim, existe alguma coisa mesmo em mim? Não saberia te dizer. Nunca sei o que te dizer. Não sei terminar esse texto. Não sei estar longe. Não sei o que estou sentindo. Isso não é literatura. Sinto muito sono e espero que você me dê notícias. O tempo todo espero notícias suas para ter a falsa impressão de você estar mais perto. There are many things that I would like to say to you but I don't now how. Não sei o que sinto por você, me confundo nas nomenclaturas, me irrito, te irrito, brigo com você e te quero no momento seguinte. Com suas camisas furadas. Fells like home. Eu com sono sinto vontade de te dizer que você é a minha casa e eu moraria em você. Queria ter tomado com você um café, visto filmes na sessão da tarde (que de domingo não é sessão da tarde), segurado a sua mão o dia todo, te deixado deitar na minha coxa enquanto fazia cafuné. Só que sinto tanto medo disso que te tenho vontade de te socar na cara. E soco. E sei que não devia. É a minha defesa. As dores da vida nos deixam com umas manias idiotas, tipo fechar os olhos quando o avião parece que vai cair. Isso não impede a queda. Nada impede a queda, se ela tiver que acontecer. Desculpe por não saber lidar. Desculpe se te chamo de amor. 


(desculpe por esse texto).



2 comentários:

Lidiane Almeida disse...

Achei uma coisa linda esse texto! :~

Rener Melo disse...

"[...] ... queria você mais perto, porque queria estar no fim dos seus dias cansados pra te fazer um chá, um café, uma salmoura."

Gostei. (=