Tudo que eu um dia senti por você formou um livro que hoje dorme na minha gaveta por falta de contingente. Metaforicamente ou não. Costumava ser um belo livro e por um dia eu achei que seria um best seller mas as coisas não são exatamente como a gente imagina. Mas eu nem imaginava tanto assim. O prefácio mesmo dizia que eu nunca esperei nada em troca de tudo. O que é absolutamente normal, se você entendesse um pouco sobre grandes sentimentos, doação, essa coisa toda que só quem amou de verdade entende e já soube fazer doer. É engraçado isso. Isso da nossa história de repente formar um livro cronológico com uma grande declaração sem fim. Pequenos príncipes envolvidos e tudo, exatamente do jeito que deveria ser o que nem chegou a ser uma história tão grande assim. Eu lembro de tentar te explicar quase no fim que aquilo não era literatura, era de-mim-pra-você e agora eu me pego pensando o quê? o que exatamente era de mim pra você e eu te juro que eu não consigo lembrar do sentimento exato, mas os escritos dizem que era um grande amor, desses de mover montanhas e brilhar olhos.
No seu livro deve ter um ponto final bem grande e você contando, no próximo capítulo, orgulhoso, o quanto você com a sua distância soube fazer eu me desapegar de você. Exatamente com essa palavra de-sa-pe-gar. E deve ter no segundo parágrafo que a explicação para a sua atitude é essa palavra aí de-sa-pe-gar. Só que a doutoura em semântica sempre fui eu, você só ilustra seu livro. Vai fazendo desenhos, colocando imagens. Vive fatos. Um atrás do outro correndo em busca da felicidade. Como num filme sem roteiro. E filmes sem roteiros as vezes terminam em grandes fracassos sem nenhum sucesso de bilheteria e com o esquecimento total do protagonista, enquanto os coadjuvantes as vezes conseguem algum sucesso em outros filmes, até mesmo como protagonistas. Mas não é disso que eu estou falando. É da nossa grande história.
Então eu te explico, como boa continuista que sou, que a consequencia da sua atitude talvez seja o de-sa-pe-gar, mas que a razão é bem diferente. E fica ali entre covardia e falta de caráter e passa um pouquinho pela falta de consideração. Consequencia normal da não reciprocidade de sentimentos é o desapego. Acontece sem ninguém precisar forçar. E é bonito esse (des)apegar. É como ir perdendo o medo lentamente da montanha russa em voltas repetidas até você conseguir lembrar da montanha russa como uma coisa bonita. Mas sua atitude só foi, como eu posso dizer, decepcionante. E não tem nada a ver com o desapego que você queria propor. Tem a ver com a sua covardia. Com o você saber que não saberia como lidar comigo enquanto eu me desapegava de você e então resolveu fazer tudo da maneira mais fácil e rápida, que é sair pra comprar cigarros e nunca mais voltar.
Exatamente como naquele filme, em que a menina fica presa ao fogão enquanto o cara foge e some em busca de uma vida, porque ele não sabe lidar com aquela que ele tem, e nem com a garota loira que hoje trabalha num cabaré. Engraçado pensar que no teu filme você talvez um dia teria escolhido ser esse cara, e parabéns, hoje você é. Só que sem dignidade nenhuma e sem nenhuma poesia, dessas dignas de filme. Mas eu não tenho ressentimentos, é exatamente como aquele trecho em que ela fala que tentava ter longas conversas com você, até o dia que não lembrava mais da sua voz. Isso é desapego. E tem dor. Eu não sinto dor, nem desapego. Eu só desisti de você, tão racionalmente que talvez você agora se sinta orgulhoso de tudo que fez.
Mas não se sinta. Orgulho não é o que você deve sentir pot você mesmo. Tem que ser alguma coisa entre arrependimento e medo. No meu livro você sempre esteve, ali, coadjuvante e é justamente pelo respeito que se deve pelas pessoas que fazem parte da sua história é que eu não merecia ter desistido desse jeito. Você merecia. Mas nós mereciamos um desapego. Desses de aprender a não ter medo de montanhas russas. Desses de lembrar de tudo com carinho, mas você estragou tudo.
E talvez, a parte boa é ter conseguido não sentir nem peso por tudo o que você já não significa pra mim. Você deve pensar que vai ser melhor assim pra mim. Mas não vai. Eu consegueria te esquecer de uma forma bonita. Eu merecia isso. Eu só quero que você saiba que você foi embora sim, e por mais que isso tenha sido bom, você me deixou amarrada no fogão. E esse tipo de marca, esse tipo de machucado é do tipo que marca pra sempre.
Seis, sete anos depois talvez você me encontre em algum lugar e eu tenha que te contar como se deu tudo, essa separação brusca e quem vai saber se até lá eu vou ter raiva, ou se não vou sentir nada, ou se vou dizer que eu te entendo. Mas o que eu queria te dizer, é que tudo que você tem, igualzinho, do personagem que você admira é isso, ser um fugitivo. Você saiu correndo. E sinceramente, cara, isso não é admirável, ou orgulhoso e nem tampouco foi nobre para comigo. Eu não vou te agradecer. Eu não vou te entender. Tudo que eu sei é que você é igualzinho a ele. Um fugitivo, um covarde. Talvez com um pouco de nobreza.
Mas saiba que nem sempre a nobreza redime. e nem sempre o amor salva. eu odeio te conhecer tanto quanto eu conheço, e no meio de tudo isso ainda entender suas razões, a covardia e a indiferença. Eu sei exatamente. Não precisa me explicar. Mas hoje não se justifica mais. Porque eu não te amo e nosso jardim secou. Pode ser o que você queria, mas não precisava ter sido assim.
Mas eu (ainda) espero que você seja feliz. Hoje sem lirismo ou poesia, e sem mim. Mas feliz.
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