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15.12.10

A gente quer ver, o horizonte distante.

Ah, se você soubesse como eu odeio dizer tudo isso que fala de mim. Como eu adoro me esconder no meio de meias-ficções. Eu chorei tanto esse ano que passou, chorei tanto essas ausências. Tanto. Choro ainda. Acordo e choro. Choro antes de dormir também, choro de vezemquando de quando em vez. Lembrando. Eu perdi tanta coisa e estou aprendendo a viver nos entremeios. Com aquilo que sobrou. As pessoas, os lugares, tudo mudou tanto-tanto. Eu tenho vontade de te ligar e dizer "ele foi embora, e às vezes eu me sinto tão sozinha". Você ia me entender, eu sei que ia. Ia me levar pra tomar um cappucino, e não ia saber lidar com a minha tristeza. E tanto faz. Eu nunca precisei de muito de você além da certeza do estar. Eu queria ser feliz, cara. No meio disso tudo, eu queria ser feliz. Mas não dá. Me falta. Me faltam as ferramentas para. Às vezes as pessoas são doces, às vezes eu acho que não preciso de mais nada da vida. Mas preciso sim. Tem tanta coisa faltando aqui-e-ali. Mas não é sempre que dá pra se perceber. E quando eu percebo, dói.

Enquanto isso, eu acho que você ia se orgulhar de saber que eu tenho tentado ser uma pessoa melhor. Eu tenho tentado agüentar tanta gente no meio dessa vida. Tanta gente que eu tinha prometido pra mim mesma que não ia trocar mais do que um "oi, tudo bem". Você ia rir se eu contasse. Ia rir ou ia achar triste, eu não sei bem. Às pessoas tem coisas boas quando você para pra olhar,sabe? É que no fundo ou elas são um pouco tristes, ou são inseguras demais, ou elas forçam demais pra serem legais. Às vezes elas só são diferentes de você e de mim. O que renderia boas piadas que a gente não conta, só olha enquanto saia com elas. Mas eu estou tentando relevar mais. Toda essa minha criticidade que você tinha medo. Não sei se tem espaço mais. Eu tenho tentado encontrar o nirvana, outro deus, a paz, qualquer coisa que seja. Eu preciso. Não agüento mais fazer as pessoas sofrerem. Eu tenho gostado muito de observar as pessoas, conhecer. É que depois que você se foi parece que eu preciso de umas trinta mil pessoas. Cada uma pra suprir um aspecto seu diferente. Eu tenho ouvido umas coisas diferentes também. Frequentado outros lugares. Não sei se é bom não, mas é diferente. Eu tenho me aventurado sem você. Sozinha. Eu tenho ficado muito tempo sozinha ultimamente. Desde que você se foi, eu me sinto sozinha no meio dos outros. Como aquela amiga que o marido morre e as pessoas ficam levando pra passear pra ver se supre a falta. Acho que você ia sorrir ao saber que as pessoas mais improváveis do mundo tem me estendido a mão. Acho que ia estranhar também. Ia estranhar eu chorando ao cantar a música que nunca foi nossa. Tem tanta coisa que eu queria te cantar ainda, acho que eu choro as saudades. Eu te cantaria todas as músicas que eu ouvisse, até as que eu não gosto. A gente costumava não gostar juntos.

Eu costumava gostar dos nossos desencontros. O descompasso tremendo em que se fez a nossa história. O tempo errado em que tudo se fez. O jeito com que você sempre chegou fora do tempo. Amor, você só sabia chegar atrasado em todos os lugares. E eu ficava ali, te esperando. Eu, sempre uma metadinha sem você ali, esperando um complemento. Se você quer saber, eu nunca mais sorri do jeito que eu sorria quando estava com você. Esses dias eu sorri sozinha, te lembrando, e lembrei também do sorriso que eu nunca mais dei. Eu fico com tanto medo de ninguém nunca mais preencher as minhas mãos do jeito que você preenchia, eu tenho tanto medo de tudo desde que você se foi. Medo da vida, do improvável, medo do acaso também. Eu tenho medo de que as pessoas que eu encontre na esquina não sejam iguais a você depois de duas conversas. E quando eu saio pra dançar, não posso mais te cantar as músicas que você ama odiar te declarando meu amor das formas mais improváveis. Eu tenho bebido cerveja demais sem você, e tenho evitado a que você bebia comigo por medo de chorar. Eu tenho evitado a minha vida um pouco, pra te dizer a verdade.

Esses dias eu refiz uma via crucis de nós dois. Andei sozinha no lugar em que a gente se conheceu. Sem música, sem nada. Chorei ouvindo meus passos. As pessoas em volta não entendiam nada. Não tem porquê. Um lugar no meio da rua, no meio da cidade. Silêncio. Faz um silêncio enorme em qualquer lugar que eu vá sem você. Todas as bandas que a gente ouvia juntos sentem saudades. Os quadros de casa, os pedacinhos de cidade. Eu te ensinei tanta coisa, você me ensinou tanta coisa também. Tem tanto livro teu, tanta coisa aqui, deve ter até roupa. Tem tanta coisa sua dentro de mim. Às vezes eu espero notícias. Espero só que você esteja sorrindo ainda do jeito que você me sorria até antes do dia que eu te vi partir. Eu espero que você esteja sonhando com alguém tomar café em paquetá. Eu não sonho com ninguém mais não. Eu sonho com viagens, sonho com tanta coisa amor. Mas a mão do lado ali, não sonho mais não. Acho que eu vou sozinha. Não tem como dividir um chalé com alguém e não querer você. Vai tocar qualquer música que não seja nossa e eu vou fazer com que seja, eu vou chorar, mas deixa.

Deixa que o mundo é grande, nossa história é tão imensa. Você chegou tão atrasado tantas vezes. Acho que você atrasou pro nosso final feliz também. Ah, amor, as pessoas sentem tanto a sua falta aqui. Sentem a falta de nós dois, às vezes, eu acho. Eu me perdi tanto desde que você foi. Eu não sei se você ia continuar me achando a coisa mais linda do mundo. Às vezes até eu deixo de me admirar. Mas tem reticências ali no fim da nossa história, eu não consegui dar ponto final nenhum quando você foi embora. Ainda tem um bocado de sonho, tem umas tintas verdes pra pintar as paredes e se você quiser a gente compra uma casa com um quarto decorado só pra você trabalhar. Eu ainda faço o café do mesmo jeito, ainda não deixei pra lá a mania de fazer brigadeiro depois do almoço. Eu continuo não comprando os livros que eu sei que você tem pra não fazer uma estante repetida. E eu nem consegui repor aqueles que você levou. É que um dia eu acho que você ainda volta com eles, com teu sorriso e bota de novo nossos sonhos pra funcionar. Eu ainda tenho chá pra sua dor, amor. Ainda não aprendi a dormir sozinha no frio e não vejo graça em ir no cinema com os outros. Não sei a medida exata, sempre sobra salgadinho e chocolate pra levar pra casa. Não sei mais a medida exata dos meus passos, dos meus sonhos e nunca mais consegui ocupar o seu lugar no sofá. No coração então, ai.

Todos os livros que eu li, amor, todas as coisas que eu passei não me fizeram inteligente o suficiente pra te superar. Eu ainda te vejo entrando por aquela porta, eu não sei quando. Eu estou tão em paz com tudo, às vezes eu danço, às vezes eu rodopio sozinha. Eu tenho visto tantas coisas lindas nas pessoas, e às vezes faz o por do sol mais bonito do mundo aqui da janela, amor. Eu tiro fotos dos mais bonitos esperando que você volte. E eu sei, que tudo soa triste. Eu sei, as pessoas tem uma certa pena de tudo isso que eu vivo falando. É que as pessoas não tiveram grandes amores. Você sabe que não. Você sabe que todo mundo que a gente conhece festejava a gente e não era inveja nem cobiça, elas eram felizes por nós. E a gente era feliz pela gente. E eu acho que um amor imenso desses não acaba assim, rápido, como quem se joga do décimo andar. Então amor, espera, acalma, a nossa vida acabou de começar. E vai ter uma sala de tv e uma biblioteca. Aos domingos a gente pode esperar o sol nascer, depois ir na feira. A gente pode ver todos os filmes do mundo às terças e sair pra jantar nas quintas. Eu te faço almoço pra quando você chegar do trabalho, eu te levo pra tomar um suco e a gente toma sorvete de sobremesa. Eu deixo uma rosa crescendo no jardim pra quando você voltar, porque eu sei que você não vai deixar ela morrer. Amor, você só está atrasado.

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