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31.5.12

only

Nunca soubemos nos dar as declarações profundas de amor. Você nunca diria olhando nos meus olhos que me amaria até o fim da vida e, pelo contrário, desvia e me oferece um café, quem sabe um resto do seu jantar que ainda está na geladeira. Você cuida de mim do jeito torto que sabe, me oferece um copo d'água, teu suco preferido e acaba, desajustado, me abraçando forte demais para que eu queira ficar. Não podíamos esperar muito de nós dois porque sabemo-nos incapazes de demonstrar isso daí que as pessoas chamam de sentimento. Eu sei, querido, somos sensíveis à tudo, sensíveis até demais e talvez por isso não saibamos como lidar com tudo isso que nasce na gente, transborda e vai embora. Você admira os parágrafos dos livros que eu gostaria de ler, embora saibamos que nunca seremos um casal que se declama poesia e prosa antes de dormir. Meu romantismo é débil, o teu é seco, trocamos poucas mensagens de celular, nos dedicamos poucas músicas, falamos pouco - e rimos alto demais. Você entende - e gosta, vai saber como - das minhas manias mais infantis, e é um dos poucos desses que se ajusta bem ao meu espírito fugitivo que nunca se deixa ficar. Te vejo resiliente enquanto eu vou por aí, pelo mundo, batendo com a cara na parede pra depois voltar, meio sem vergonha nenhuma e te convidar pra mais uma cerveja, só pra ver o que ainda sobrou. Sempre sobra um pouco, nem que seja porque somos pessoas de muitos traumas, de pouca sorte e de muito sonho. Sempre sobra um pouco da primeira vez que te vi e não pensei em nenhum momento em te tratar como estranho, porque te conhecia há séculos, num estranho reconhecimento de coisas que eu nem sabia que existiam em mim. Fica teu desajeito ancestral e a minha mania de quebrar os copos - e sujar as casas. Fica teu riso histérico e o meu nervoso (ou seria ao contrário?). Fica história de amor nenhuma, porque amor é coisa de ler nos romances e não de viver no meio da sarjeta, nas ruas escuras e no clima frio em que se apresenta os maios e junhos. Fica eu e você, uma leva admiração mútua (quase tiete) e as lembranças esparsas de nós dois que vêm assim, nessas madrugadas frias de maio, onde eu chego à conclusão que talvez seríamos mais felizes se tivéssemos aprendido a lidar com ele, o sentimento, mas que fazemos o que podemos. Fica a única coisa que eu pude concluir disso tudo: o que importa é que a gente se faz sorrir (ainda). 

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