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23.6.12

there's more to give then what you take from me

Eu olhava os barcos e pensava nos filhos. Ainda queria tê-los? O problema não eram os filhos em si, mas todas as certezas que eu um dia tive e agora tinham se tornado dúvidas. Era o pior momento da minha vida. Eu segurava meu cabelo num coque desgrenhado e olhava o horizonte à procura de respostas. Já tinha perdido tudo: o emprego, um grande amor, meus grandes amigos tinham mudado de cidade depois do término da faculdade e naquele momento eu me encontrava juntando os cacos da minha última decepção amorosa. Num dia pensávamos em casar, e no outro ele me odiava de tal maneira que devia cuspir ao dizer meu nome, como quem tira de si uma coisa que tem nojo. "Mas era assim, a vida", eu tentava me consolar. Não funcionava. A resiliência é mais fácil quando se tem entre dezoito e vinte e um anos, mas depois disso é tudo muito pior. Toda aquela tragédia amorosa sinalizava pra mim que eu nunca mais seria capaz de fazer planos com mais ninguém. O peso das escolhas erradas vai batendo no ombro da gente de tal forma que depois não tem mais como carregar. Tudo tinha se bagunçado de um jeito tão estranho que eu me questionava até sobre as minhas certezas mais primordiais. Os filhos, eu não sabia mais se queria ter filhos. E não era só isso, eu não sabia mais de nada. Nada. O não saber de nada te dá, supostamente, um certa liberdade. Quando você não sabe de nada você pode fazer absolutamente qualquer coisa. Mas eu não fazia nada. Permanecia parada olhando o horizonte pensando o que seria de mim aos vinte e três anos. Não tinha resposta nenhuma. E eu precisava de respostas. Mais do que nunca. Qualquer uma delas.

trecho perdido em mais um dos arquivos da madruga que há uma semana nomeei de "livro".

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