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11.6.12

you could see it coming.


Vejo fotos de quando eu tinha o cabelo preto-azulado e lembro que tinha essa foto no finado orkut, com a legenda da música do chico buarque. "ela faz cinema". Não sei por quanto tempo essa música foi "a minha música". O hino da mulher dissimulada. Livre. "Ela faz cinema é tão aquariana, né?", meu amigo dizia. É. Luiza também, sabe? do Tom. Chico buarque entoava "Sob Medida" no show e eu gritava baixinho "minha música". Era mesmo. Foi. Por muito tempo. Sou bandida, sou solta na vida. Sou aquariana. Livre. Rapte-me, Camaleoa. Começou com o Dexter, tudo isso. Sabe, o laboratório? Lembro de um episódio em que transformavam a dee dee na princesa poney puff. As amiguinhas dela todas queriam montar nela, fazê-la de escrava. No fim do episódio ela bradava: "Ninguém pode domar a princesa poney puff porque ela é um espírito livre!". Subnick do meu msn por anos. Ninguém pode domar a princesa poney puff. Eu, princesa poney puff, prazer. E foram vinte anos sendo assim. Vinte anos inteirinhos. Até que a princesa poney puff se apaixonou. "Ninguém pode domar a princesa poney puff porque ela é um espírito livre". Fugi. Fugi por meses. Era livre demais pra essa coisa de paixão, querer casar, imagina só ter uma família, viver pra-sem-pre com a mesma pessoa? Calafrios. Até que ele apareceu. Usava as calças erradas, tinha o corte de cabelo errado, um sorriso torto e as piores piadas do mundo. Não sabia abraçar. Dava um beijo no rosto muito esquisito. Às vezes me cumprimentava com um aperto de mão. Chegou ao cúmulo do aperto de brother. Me passou todos os filmes preferidos dele pra eu ver, sem nem perguntar se eu queria. Me dava inúmeros CDs com as bandas preferidas dele. As piores piadas do mundo. Amava sempre as músicas que eu mais odiava. Não sabia escrever direito, mas se achava bom. Delírios de grandeza. Morar fora do país. Um cinto caramelo horroroso. Comia tudo que visse pela frente. Gostava de vinho barato. Achava graça nas piores esquetes do hermes e renato e depois repetia de um jeito débil. Ele, inteiro débil. Normal. Um cara normal. Livros, filmes, piadas de garotos, reparava nas gostosas da festa. Tímido. Me entendia pelo olho. Me mimava. Tinha o abraço desajeitado mais legal do mundo. A melhor companhia pra todos os eventos. As melhores mensagens de texto. As melhores piores piadas do mundo. O jeito encantador de escolher roupas que nunca combinavam entre si. O all star sujo. O cinto caramelo poído. As calças de lavagem esquisita. Corinthiano. Manias de escolher lugar no cinema. No meio, sempre. Ele cuidava pra que eu não me matasse. Escutava as minhas crises. "Calma, sua vida não é tão ruim assim". Meu leitor mais dedicado. "Todo mundo sabe que você escreve bem". Carregava minha cesta de compras no mercado. Depois as sacolas. Elogiava a minha comida. Soube lidar. "Ninguém pode domar a princesa poney puff porque ela é um espírito livre". Exceto por ele. Ele podia.

Eu quis casar com ele. Construir família. Dividir sobrenome. Morar numa kitnet. Cozinhar todos os dias, almoço e janta. Ele lavava a louça. Morar na puta que pariu. Dividir os eletrodomésticos em dez vezes. Quinze. Ter uma estante de livros. Dividir a estante em vinte e quatro vezes. Andar de ônibus. Ter dois filhos. Tomar vinho ruim pro resto da vida. Ele era o meu caminho. A minha salvação. O amor da minha vida. Não importavam as circunstâncias. Vinho ruim em copo de plástico, tomar chuva, perder os chocolates preferidos da minha caixa de bombons, fazer chocolate quente em todos os fins de semana, ouvir as piores piadas do mundo: e rir. O amor da minha vida. Nenhum defeito. Olhos fechados pro egocentrismo, vista grossa nas manias de grandeza, nisso de querer ser popular, reconhecido, "o funcionário do mês", morar fora do brasil (aqui nada funciona). Tudo ridículo. Tão débil ele. O amor da minha vida. Lindo. Débil e lindo. Sempre lindo. As piores escolhas de roupa do mundo. Lindo. Moletom por baixo da jaqueta de couro. Inaceitável. Lindo. Eu, completamente apaixonada. Pela primeira vez na vida não ligava de ser domada por alguém, estar completamente vulnerável, fazer planos, querer passar juntos todas as festas de família. Declarei-me completamente apaixonada. Integralmente apaixonada. Cantando-lulu-santos-na-cozinha kind of apaixonada. Daí ele se foi. Fiquei numa cadeira, chorando. Eu, meu moletom roxo, meu all star vermelho furado, minha camiseta do surfista prateado (igual a dele), meus cabelos descoloridos. Sem chão. Chorando baixinho na cadeira no meio da festa. O amor da minha vida foi embora levando metade de mim, e todos os meus sonhos. Um ano e meio de sofrimento. Chico Buarque. Ninguém podia mesmo domar a princesa poney puff. Sou bandida sou solta na vida. Festas. Namoros casuais. Desilusão. De novo a cadeira. "Um dia ele se toca e me busca". O amor da minha vida. 

Ele não era o amor da minha vida. Ele era o amor da vida dela. E eles são felizes, embora ele esteja mais magro e mais feio. Ou eu acho isso, porque não amo ele mais. 

Faz uns três meses que descobri que não amo ele mais. Talvez menos. Jurava que eu ia chorar por ele pelo resto da minha vida. Ou um dia ele ia vir me buscar. Eu, solta na vida, fodida, chorando na janela com meu batom vermelho depois de seduzir meio mundo. Esperando por ele. Ele vem, me pega pela mão. Vamos casar-e-construir-família. Não vai acontecer. Não amo ele mais. Ele é o amor da vida dela. Ok. Ninguém pode domar a princesa poney puff porque ela é um espírito livre. Bandida, solta na vida. Nunca será de ninguém. Dessas mulheres que só dizem sim. Don't play that stupid game 'cause I'm a different kind of girl. E sou. Livre. Aquariana. Não tente me prender, eu escapo pelo vão dos seus dedos. Flerto até com os vasos de planta na rua. Finos meninos se inclinam pro lado do sim. Jogos de amor são pra se jogar. Desilusões, desilusões. Vinte e três anos jogando. Estou cansada. É difícil admitir. Estou cansada. Cansada dos jogos, das maquiagens, dos batons vermelhos. Eu sou bem fodida, sabe? Eu chorei por um ano e meio inteiro por ele. Mas ele ia me buscar. Agora eu não amo mais ele e eu sei que ele não vem mais. Me sinto como aquelas putas velhas do bordel que se cansaram de tanto seduzir clientes. Não gosto de admitir que sofri. Fato é que me sinto sempre sentada naquela cadeira onde ele me deixou. Frágil. Apática. Perdi a única coisa pela qual me permiti ser domada. Limpava as minhas lágrimas no meu moletom manchado de água sanitária. Não sei lavar minhas roupas. Não sei brincar de amar. Estou completamente sozinha. Não existe nem ele assim, referencial. Não existe o amor da minha vida. Ele está feliz com ela, e eu estou feliz por ele. Tudo acabou. Eu finalmente parei de sofrer, mas não quero de novo. Não quero de novo amar e não ser amada. Não quero ser deixada na cadeira chorando. Queria estar mais forte. Queria voltar pra tudo aquilo, rapte-me camaleoa, nunca será de ninguém, ser dessas mulheres que só dizem sim. Sempre fui assim. A vida toda assim. Só com ele que não. Um simples deslize na corda bamba da vida. Quis finalmente sossegar e ele me deixou. Porque tinha que deixar, é claro, a vida é assim. Mas meu coração cansou. Está cansado. Não sei mais jogar. Não sei mais lidar com frustração. Meu coração continua sentado naquela cadeira enxugando as lágrimas num moletom sujo de comida. Desajeitado. Frágil. Vulnerável. Quebrado. I'm pretty fucked up. De um jeito que você só percebe quando chega muito perto. Tenho muito medo. Muito medo mesmo. Como aquelas crianças que temem em dar o primeiro passo e se estabacar no chão. Ando pelas estradas do amor com uma bicicleta com rodinhas. Não deixo que tirem as rodinhas. Não sei brincar. Acho que não quero me declarar nunca mais. Não assim, amor de verdade, sinceramente, com planos de casar. Tenho medo. Medo de estarem mentindo. Medo de estar me enganando. O tempo todo, medo. Passei da fase da dissimulação. Preciso de sinceridades. Estou velha e preciso que sejam francos comigo. Não posso mais ser deixada desavisadamente numa cadeira e ver a pessoa que eu amo sair de mãos dadas com o verdadeiro amor da vida. E eu sozinha. Chorando. Com meu all star furado e meu desajeito. Não agüento mais um baque desses. Fico sempre tentada a abandonar tudo antes que aconteça o abandono. Me auto saboto. Tenho medo que meu coração não volte a bater de novo, se acontecer mais uma dessas. Me protejo. Ninguém pode domar a princesa poney puff porque ela é um espírito livre.

Não sei o que aconteceu com essa mulher livre. Queria voltar a ser. Mas estou cansada. Machucada demais. Fico quietinha esperando que verdadeiro amor da vida (se existir), chegue de mansinho, sem forçar demais, sem machucar demais. Não sei comer sem me sujar, erro as vírgulas, meu coração explodiu nos últimos dois anos, ficou só os destroços e daí desaprendi a ser assim, sob medida pros carinhos teus. 

Ninguém pode domar a princesa poney puff porque ela já sofreu o suficiente. 
(mas secretamente ela ainda espera que alguém consiga).

É que no fim, todo mundo espera um amor pra vida inteira. Até a Luiza do tom, a menina que faz cinema do Chico, as bandidas soltas na vida, e as camaleoas. Até eu espero. Alguém. Um dia. 
Que merda. 


(Escrito em 19/03/2012 - Uma profecia; ou: eu sabia que tudo ia dar errado e eu não ia aguentar. Bingo. I was not ready for). 

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