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17.1.12

There's no light over London today

escrevo. mas nunca fui boa em escolher as palavras certas para encontros cara-a-cara. não sei como me portar frente a situações limite, não sei o que dizer, nunca fui boa em consolar. sei que a vida exige da gente um certo saber-lidar, uma dose de coragem, três tantos de destreza. A vida te pega as oito da noite com notícias inesperadas, no meio de uma tarde que não pretendia nada demais, nem nada de sério. porque as pessoas nascem, crescem, criam famílias ou não, são felizes ou nem tanto, envelhecem (ou não) e morrem. morrer é o inevitável e ao mesmo tempo o tropeço da vida. a única certeza e a pior dúvida. sabemos que morreremos, mas quando? é a pergunta que atormenta. às vezes é assim, as quatro da manhã de uma segunda feira qualquer. quando a gente envelhece, a morte de gente que a gente nunca viu passa a afetar a gente. nossos amigos perdem também parte de suas famílias e quando um amigo perde uma parte de qualquer coisa, a gente também perde uma parte da gente. nunca sei o que dizer exatamente nesses casos. só sei que a vida é assim, inesperada, corrida, fatal. sei que o caminho dos nossos avós é a morte, e logo mais o caminho dos nossos tios, e - que terrível - também o caminho dos nossos pais. todos nós somos filósofos frente a morte. pensamos sobre o corpo, sobre o encarar o fato, sobre que caminho faz a alma (se a alma existir). o que somos nós frente à imensidão do mundo, porque corremos tanto, porque nos desesperamos, porque fazemos dívidas, compras, exibimos carros, porque nos lamentamos em bancos gelados as duas da manhã porque não temos mais perspectivas? qual é o sentido de tudo isso se no fim estaremos deitados no caixão, cheirando a cravo e coroa de flores? everything is falling. eu, você, a nossa vida, tudo aquilo que conhecemos, nossa cidade, nossas famílias. tentamos reviver nosso passado e não conseguimos, tentamos ser felizes de novo e falhamos, porque a vida é um pouco como a morte também. algumas coisas depois que se vão se tornam definitivas. outras, por outro lado, se tornam lembranças eternas, pedaços de coisa infinita, a alma que continua vivendo depois da morte do corpo. nunca fui boa em escolher as palavras certas para os encontros, mas entendi que certas coisas se dizem melhor no silêncio. de algum jeito torto eu te entendo, de de algum jeito torto também você entende que é assim. te diria mil coisas, quem sabe, tentando traduzir o desejo de consolo em palavras, mas sei que não posso. a dor da morte é só nossa, não tem como dividir. mas o que é a amizade senão isso? o eterno desejo de, se não conseguir dividir a dor da vida, ao menos conseguir distrair dela. no meio da chuva e do cheiro de cravo eu entendi que, por mais que certas coisas mudem muito, outras tem o poder de permanecerem do jeito que estavam. são as coisas que continuam em silêncio. é o laço invisível das relações. amizade em estado puro. (re)conhecimento.

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