Páginas

21.1.12

você precisa é de um homem pra chamar de seu


(não consigo escrever há uns dois dias e pra manter esse querido blog atualizado, os deixo com um texto escrito há quase dois anos atrás - e nunca postado).

Licença, hoje eu quero falar é de mim.

Não que eu não fale das outras vezes, entendam bem, é SÓ o que eu faço. Mas hoje, especialmente, quero dizer, eu, primeira pessoa do singular, assim, personagem de nada, só existindo como se deve. Eu, há 21 anos, tenho evitado sempre que posso o termo "melhor amiga". Não por nada, apenas assim, nunca a tendo tido, evitei. Também evitei o termo "melhor amigo", mas aí por razão contrária, completamente díspar: por não saber escolher. Agora amiga, sempre tive uma só. Em momentos diferentes, mas sempre. Uma, e mais uma legião de meninos do lado. Tenho uma alma masculina, quem sabe, prática. E gosto da troca de experiências entre mulheres e homens. Não no sentido físico, mas no existencial, quem sabe. Homens são mais práticos no lidar, não competem com você e não sofrem de TPM. Eu também não sofro, e não compreendo a histeria das outras mulheres, e muito menos a necessidade delas de justificar o mau humor em hormônios. Devo acrescentar, sou bicho-homem. Ou aprendi a ser por falta de meninas do lado. Quando criança só tinha primos, e brincava de bola. Filha única, bonecas apareciam vez ou outra, mas como brincadeira solitária. Aprendi a ser menininha com a minha tia, e a ser menino com meu pai, que em não tendo um filho homem, me ensinou o futebol, o gosto pelos esportes e a praticidade. Na escola sempre tive amigos meninos, mesmo quando as outras meninas odiavam os guris. Lembro do Rafael, do Felipe. Lembro de me juntar na parte de trás da salas e jogar aquele jogo de almofadinha com eles, três ou seis marias, não sei bem o nome daquilo. De melhor amiga tive algumas, que fizeram rodízio, e nunca mais de uma. Pelo menos não como assim, melhor amiga. Fora isso nunca tive a estranha cumplicidade das mulheres que se unem contra os homens-cachorros. Homens não são cachorros, não são invejosos e principalmente, não perdem tempo com tantas bobagens. 

Mulher é bicho-fêmea, quer marcar território, ser grande, ser a única, ser a alfa. Homem não. Homem divide, compreende, toma cerveja e se ferra junto sempre que pode. Homem se doa num sentido não egoísta. Doa sem saber que se doa, por companheirismo puro. Não deseja nada em troca. Meus fiéis escudeiros sempre foram da raça masculina. Os meus meninos do segundo, do terceiro colegial, depois da faculdade. Já as meninas, até se doam. Mas olha, me decepcionei demais nesses vários anos de amizade feminina. Mulher sabe ser multifuncional, mas só antes de encontrar o amado. Depois disso se atrapalha toda em função dele, e vira sim, vira mulherzinha. A primeira amiga que perdi por conta de bicho-homem foi na sétima série, quando apareceu-lhe o primeiro namorado. Eu, bicho solto, ficava ali, sobrando, como filho ciumento que tenta pegar um pouco da atenção que a mãe atribui ao pai. Confesso, não foi bom. Faltava-me. Faltava me o ombro, o aconchego, e principalmente - a exclusividade. Não que nenhuma pessoa que comigo convive deva existir apenas para mim, mas deve, existir quando assim sinto preciso. Faltava. Não havia mais o tempo para os shoppings, as longas conversas. Faltavam-me as cartas, os telefonemas, as mensagens. E em pouco tempo faltava a preocupação, a atenção e o cuidado. Meses depois, minha melhor amiga não existia. Existia a namorada de fulano, coisa-pertence, ser-humano perdido. 

E assim foram acontecendo sucessivamente, a troca. Não é que eu exigisse o tempo todo pra mim, mas é que o tempo para mim apenas deixou de existir. Deixou também de existir em todas elas a persona "amiga". Sobrou apenas a persona "namorada", a amélia que reside em cada mulher e que gosta de cuidar - e ser cuidada - por seu homem, sempre que assim precisar. Ou melhor dizendo, sempre. E foi assim que me desapeguei não só do termo "melhor amiga", como do fato. Tenho sim, amigas, umas até muito incríveis e que estão ali. Mas temo. Temo perdê-las para qualquer bicho-homem que aparecer em seus caminhos. E afirmo: temo e vou. Não sei se isso é parte integrante da vida de toda mulher: um dia entregar-se inteira a ser apenas o pertence de outro ser, mas aconteceu com todas as espécies-amigas que cruzaram o meu caminho. Elas negam, dizem que não e bradam sempre que podem: "sou uma mulher independente". Não o são. A dependência do século XXI não reside mais nas coisas de outrora. É claro que (quase) nenhuma delas se presta a passar tardes cozinhando e lavando a roupa de seus respectivos e nem tampouco dependem deles financeiramente. Até o contrário. Vangloriam-se de não saber fritar um ovo e de pagar metade da conta no cinema e do restaurante. Depois gritam: "não dependo de homem nenhum". Tolas. A grande dependência é a emocional. Não cozinham para o seu bicho-homem, mas não saem sem ele. Exibem culpa. Culpa de aparecerem de mãos vazias na rua quando na verdade pertencem a alguém. Necessitam do estar diário quase que doente. Necessitam de ouvir te amos diários. Necessitam de ter o bicho-homem ao seus pés todos os dias da semana. Sacrificam aquilo que tem de mais sagrado: seu tempo. E gastam todo ele em função de agradar seu bicho homem. Não com comidas, com roupas lavadas, com a subserviência do dinheiro. São dependentes hoje do afeto, do carinho, da presença e quem sabe até do pau. É, do pau. Mulher é dependente de companhia. Companhia de homem, de macho, de ser-que-cuida. Mesmo que esse seja falho e não exerça nem metade das funções que deveria. E por ele se doa, se transmuta, e esquece seu universo. Mulher de hoje depende de homem. Não pelo o que ele é, e sim pelo que ele representa.

E são assim essas minhas mulheres (salvo raras exceções). Dependem de homem pra sobreviver. Deles. Do existir deles. Do respirar deles. Do bem estar deles. E eu não estou dizendo que isso é errado não. Homem é ótimo. Quando na dosagem certa. Pode, é claro, durar pra sempre. E eu não duvido que um ser possa se fechar apenas dentro de sua vida com seu homem. Mas pode também acontecer de acabar, e essa mesma mulher se ver sozinha e já sem nada. E daí, corre pra onde? A procura de outro homem, pois não aprendeu a ser verbo intransitivo. É verbo transitivo direto. Depende do complemento. E aí põe os pés pelas mãos a procura de qualquer homem que seja, que represente companhia e um pau. Mesmo que seja o pior dos homens do mundo. É homem. É complemento. Desisti de ter melhores amigas, porque não sei estabelecer relações de posse. Tenho amigas. Poucas. Boas. E que felizmente, aprenderam a ser. Existem com seu homem, mas também existem fora deles. Não vou mentir. Hoje enxergo apenas umas duas. Logo talvez nem isso. E aí você me pergunta, e você? Como disse, sou bicho-homem. E isso não é lá superioridade nenhuma. É até de uma grande cafasjestagem. Admiro os homens e os tenho perto, como amigos fiéis, porque eles aprenderam a largar as mulheres em casa para uma pelada com os amigos, ou uma cerveja no bar. Admiro esse homem. Que existe enquanto companheiro, mas que existe também enquanto pessoa. Com e sem a sua mulher. Egoistamente, sabendo ser gente. Admiro a mulher que larga seu homem por um passeio no shopping com uma amiga, por uma cerveja no bar, por uma noite sozinha com brigadeiro e filme meloso. A mulher que sabe que ser a namorada, ou a mulher de alguém é um estado e não uma condição. E pode passar. Admiro também a mulher que passa a tarde toda cozinhando para seu amado e tem com ele uma tarde imensa de amor, os dois e os dois apenas. Mas que não faz só isso. Faz também isso. Entendem a diferença?

E depois de duzentos e duas decepções, digo a vocês: não tenho melhores amigas, e largo sem culpa alguma meu namorado em casa por qualquer uma de minhas meninas - ou meninos. Não é insensibilidade não. É condição humana do verbo ser. Verbo Intransitivo. E em primeira pessoa do singular: sou. E só dependo de complemento quando quero, e principalmente, quando - e porquê - me faz bem.  

Nenhum comentário: