Páginas

27.1.12

I get by with a little help from my friends

A vida é isso. É essa coisa que passa rápido demais, e quando você se dá conta, está numa sala (a mesma sala que povoou o início da sua juventude) discutindo o que serão dos anos vindouros. Somos meninos formados, deveríamos estar crescidos, pensando em nossos empregos (quase) fantásticos, nossa carreira acadêmica brilhante, nossa cidade dos sonhos pra mudar. Discutimos por horas a fio sobre porque tudo é tão errado, as pessoas querendo ser prodígios com seus vinte e poucos anos, nossa falta de independência, nossas ainda-não carteiras de motorista, nossos amigos que não se deram tão bem assim. Todos nós, em nossos períodos sabáticos, sentados no mesmo sofá verde de outrora, pensando em enviar currículos ou não, em entrar em mestrados ou não, em querer uma vida confortável ou querer fazer alguma diferença. Nós, jovens, quase vinte e três anos. Nós, perdidos, a geração onde não existe deus ou esperança, sem saber se casaremos, se constituiremos família, ou se estaremos vivos no minuto seguinte. Seria dois mil e doze mesmo o ano do apocalipse? O ano da mulher de duas vaginas, de luíza que voltou do canadá, das aberrações genéticas, dos experimentos revolucionários. Queremos conhecer o mundo, ou queremos ficar perto um do outro, em nosso velho sofá verde, tomando chá mate com limão? Queremos colocar em prática a última orgia antes do fim do milênio? Ainda lembramos que tinhamos essa brincadeira, quando éramos mais jovens, tinhamos menos responsabilidades e tomávamos cuba libre ao som de músicas que (ainda) não sabíamos que sentiríamos saudades? Acho que não sabemos de mais nada.

A vida se mostra incerta, nessas noites frias em que se pensa não sair de casa. Tudo uma imensa neblina, como aquela que tomou Londrina inteira, anteontem. Tudo muito incerto. Carreira, lugar pra morar, o salário ideal, como começar a minha monografia, família, namorado, relacionamento. Tudo prestes a se consolidar ou a ruir no instante seguinte. Queria uma vez na vida ter um pouco de certeza daquilo que quero, estar confiante, pensar em um caminho só, traçar uma meta, mas me falta ritalina na alma. Não tenho foco, nasci desprendida demais, nunca consegui terminar um jogo de videogame, nunca consegui enxergar o meu futuro todo segurando na mão de alguém. Nunca me enxerguei sendo designer, justo eu, a menina que aos dez anos de idade já dizia querer ser escritora. Me enxergo muito pouco, ainda. E isso, mas também me enxergo muito pouco profissional, me enxergo muito pouco ser humano, me enxergo muito pouco "a namorada dele" e ainda menos a "mulher dele" ou a "mãe dela". Aceitei ser, por vezes, o complemento de alguém. Duas vezes. Duas únicas vezes pra depois desistir disso pra sempre e ficar em imensas novelas sem fim de descontrole e desconcerto. Hoje, às quatro da manhã, não sei nem a cidade em que quero morar. Nem o que quero fazer amanhã. Sinto algumas várias saudades, de muita gente, de gente que está aqui, de gente que se foi, de gente que se mudou assim, existencialmente falando.

Vejo mudanças em todos nós. Cada dia menos gente frequenta os sofás verdes desgastados, embora ganhemos algumas novas aparições every now and then. Apesar de tudo isso, sei que não mudamos tanto-assim. Ainda sinto em vocês o mesmo olhar cúmplice que sentia três, ou quatro anos atrás. Falo pra vocês que não sei o que vai ser do meu futuro e sou compreendida. Entendo que todos nós estejamos perdidos, jogados no mundo, sem muitas previsões de nada. Sei que tenho um lugar no mundo, um lugar qualquer que seja, quando alguém me deseja de coração que eu esteja "forever young" e eu desejo de volta, com todo meu coração. Sei que a vida ainda vale um pouco a pena quando nos refastelamos no sofá verde conversando sobre tudo que vem à cabeça. Quando planejamos ganhar na mega sena. Quando planejamos mudar de cidade. Eu acho que não sei ter outros amigos assim, melhores que esses. Nenhum outro vai fazer experimentos no quarto de casa, nenhuma outra vai ter um abraço tão reconfortante, nenhuma outra vai me levar no show do Bob Dylan, nenhum outro vai me abrigar em casa sempre que eu precisar, nenhum outro vai planejar um ano todo comigo e o ano que vier também.

Concluo que já pensei algumas vezes em abandoná-los, já fui frustrada algumas vezes, já me senti sozinha na aventura errante que apelidamos de "vida". Confesso que já pensei em sumir, procurar consolo em outros ombros, já tive raiva, muita raiva de todos vocês. E sei que você já devem ter tido de mim. Sei que nossas relações desgastam, como qualquer outra relação, e sei que, por vezes ficaremos afastados. São quatro da manhã, eu cheguei em casa e não tenho ideia do que quero fazer da minha vida. A mais vaga ideia. Não sei se quero londrina, se quero são paulo, se quero curitiba. Não sei se quero design, webdesign, se quero a folha de são paulo, se quero redigir textos pro resto da minha vida. Não sei o que quero fazer sábado que vem, quando quem sabe estiver em são paulo. Me sinto mais do que nunca perdida, jogadas às traças, bicho solto no mundo. Me sinto mais do que nunca, a mais solitária dos seres, a página mais em branco que pode existir. Não tenho emprego, perspectiva, não tenho amores, não tenho planos, não tenho nada. Mas tenho vocês. E sei, que deitada no sofá verde desgastado, me sentirei em casa.

Um comentário:

Anônimo disse...

The more you think about your own self, the more self-centred you are, the more trouble even small problems can create in your mind. The stronger your sense of ‘I’, the narrower the scope of your thinking becomes; then even small obstacles become unbearable. On the other hand, if you concern yourself mainly with others, the broader your thinking becomes, and life’s inevitable difficulties disturb you less.

- Dalai Lama